"Uma criança é como o cristal e como a cera. Qualquer choque, por mais brando, a abala e comove, e a faz vibrar de molécula em molécula, de átomo em átomo; e qualquer impressão, boa ou má, nela se grava de modo profundo e indelével." (Olavo Bilac)

"Un bambino è come il cristallo e come la cera. Qualsiasi shock, per quanto morbido sia
lo scuote e lo smuove, vibra di molecola in molecola, di atomo in atomo, e qualsiasi impressione,
buona o cattiva, si registra in lui in modo profondo e indelebile." (Olavo Bilac, giornalista e poeta brasiliano)

sábado, 31 de julho de 2010

Adoção: dicionário de terminologias mais adequadas

Foto: Cintia Liana com amigos. Autorizada a divulgação.

Errado e Certo

Filho adotivo - Filho

Esperar um filho - Gestar um filho

A mãe deu a criança para adoção - A mãe escolheu a adoção para seu bebê

Minha filha é adotada - Minha filha FOI adotada

Pegou para criar - Encontrou para amar

Encontrou para amar - Adotou

Filho do coração - Filho

A mãe biológica resolveu ficar com a criança - A mãe biológica desistiu do plano de adoção para seu filho

Filho dos outros - Filho adotado

Tenho 3 filhos, 2 meus e 1 adotado - Tenho 3 filhos

Pai adotivo - Pai

Mãe adotiva - Mãe

Adotei uma linda menina negra - Adotei uma linda menina

Que a criança reconheça o que você está fazendo por ela - Ela não me pediu nada, não estou fazendo favor

Vou adotar para a criança ter uma vida digna - Vou ser pai/mãe, melhorar como pessoa, dar e receber amor, para tornar-me um indivíduo melhor

Filho adotivo dá trabalho - Filho dá trabalho (independe se biológico ou adotivo)

Você mudou a vida desta criança - Ela deu sentido às nossas vidas


Organização e compilação: Andréa Goulart


Por Cintia Liana

quinta-feira, 29 de julho de 2010

O Passo a Passo da Adoção

Foto: Google Imagens

1º – Ir até o Serviço Social ou Setor de Adoção da VIJ (Vara da Infancia e Juventude) de sua cidade, falar com uma Assistente Social ou outro profissional responsável e pegar a lista de documentos a serem entregues para a abertura do processo de habilitação;

2º – Entregar documentos exigidos e fazer estudo social no Serviço Social;

3º – O Serviço Social realizará uma visita domiciliar;

4º – Em paralelo será agendada e feita a avaliação psicológica no Serviço de Psicologia do mesmo órgão;

5º – O candidato deve esperar para que o Ministério Público e o Juiz se coloquem contra ou a favor da habilitação frente a toda a documentação e avaliações necessárias da equipe multiprofissional do Juizado. Se a entença mediante o pleito for positiva, os habilitados já serão automaticamente encaminhados para o cadastro nacional e já farão parte da lista;

6º – O adotante receberá um telefonema do Serviço Social, quando tiver uma criança para adoção, pedindo que se dirija até lá para o recebimento de uma carta, para que visite a criança indicada em sua instituição;

7º - Caso haja empatia entre os interessados, a criança será novamente visitada até que possa ser liberada para o estágio de convivência, que acontecerá durante o tempo determinado pelo Juiz;

8º – Durante o estágio de convivência, a família receberá algumas visitas do Serviço social;

9º – O Serviço de psicologia agendará atendimento(s), objetivando avaliar o vínculo entre adotantes e adotando;

10º – Concluídos relatórios, serão anexados ao processo, que será destinado ao Juiz, que marcará audiência para a conclusão do processo de adoção;

11º – O(s) adotante(s) receberá(ão) intimação judicial em sua residência, e deverão comparecer no dia e hora marcada para o encontro com o Juiz e Promotora de Justiça do Ministério Público, onde, encontrando-se tudo dentro das determinações, o(s) requerente(s) receberá(ão) a sentença do Juiz e um documento que servirá de instrumento para que seja feito o novo registro civil do adotando.

Eventualmente algo pode mudar de comarca para comarca mas, no geral, ocorre assim o processo de habilitação e de adoção.

Por Cintia Liana

terça-feira, 27 de julho de 2010

Biossíntese e Sistêmica Familiar

Foto: Luz Art. Google Imagens.

Texto do site da Escola de Biossíntese do RJ
Por Esther Frankel e Milton Corrêa


Uma vez, um velho e respeitado padre foi visitar uma família numerosa. Ficou hospedado por mais de uma semana e foi recebido com muita honra. A família se esmerou no tratamento ao seu visitante dando-lhe o melhor de si.

Quando o velho padre foi embora, ainda no portão da casa, ao se despedir e diante de todos disse: “Que morram os avós, que morram os pais, que morram os filhos e que morram os netos”.

Ficaram todos surpresos e chocados. Como? Disse o avô, o patriarca da família, recebemos o senhor com todo o nosso carinho e respeito e o senhor nos deseja a morte?

Ah! Disse o velho sábio, “mas nesta ordem!”.
O velho padre, com amor, abençoava aquela família.

Podemos entender esta benção, pois é muito doloroso quando acontece uma inversão desta ordem.

Esta história ilustra bem o que significa a “ordem do amor” ou a hierarquia dentro de um sistema familiar. O mais antigo vem antes, quem entra no sistema familiar primeiro tem certa precedência sobre os que entram depois. Primeiro são os pais, depois os filhos, o primogênito antes do segundo filho etc.

Uma outra lei desta organização é a que exige o reconhecimento e a não exclusão de um membro da família. Estas são leis naturais que organizam um sistema familiar e precisam ser respeitadas. Assim, cada um deve ser reconhecido no seu lugar adequado e dentro do sistema. De outro modo, o sistema familiar ficaria perturbado, podendo os seus membros sofrerem doenças, conflitos e acidentes.

Às vezes, um membro da família, por amor, tenta ocupar o lugar do outro, seguindo-lhe o destino. Assim, por exemplo, um filho pode seguir o destino de um pai alcoólatra, ou um avô suicida, inconscientemente e sem o desejar. Uma força que ele desconhece o atrai para este destino.

Estas são algumas leis sistêmicas que podem ser observadas quando são colocadas as constelações familiares. Estas forças são definidas por um campo de intencionalidade da família. Um outro modo de dizer é que elas fazem parte da alma da família. Preferimos o termo campo que pode ser compreendido no contexto operacional da ciência moderna.

Em Biossíntese, uma psicoterapia somática, os movimentos e as expressões corporais acontecem através de campos motores por detrás dos quais estão campos de intencionalidade.

Compreendendo as interações entre estes campos de intencionalidade vemos que os processos somáticos despertados durante as colocações das constelações ou ainda as constelações que podem emergir a partir de processos somáticos podem trazer uma nova direção de profundo efeito curativo em que a força da expressão somática é reintegrada num contexto sistêmico familiar.

Por Esther Frankel e Milton Corrêa

Este texto pode nos levar a refletir sobre a ordem de chegada dos filhos adotivos, o mais velho e primeiro a chegar deve continar sendo o mais velho na medida do possível, e sobre a atenção em não querer substituir alguém da família adotando uma criança.

Ninguém deve levar o fardo de ocupar o lugar de outro que se foi e de cumprir uma responsabilidade que não é sua, como também é injusto dar a alguém a responsabilidade de ser adotado e ganhar o nome de um avô falecido, por exemplo, com a intenção de fazê-lo presente na família, isso é falta de respeito com a vida e o destino alheios.

Por Cintia Liana

domingo, 25 de julho de 2010

Moldar uma criança?

Foto: Google Imagens

Ouvi algumas vezes adotantes dizerem que queriam adotar um bebê por ser mais fácil de moldar e de colocar do seu jeito.

Desculpe se pareço grosseira, mas considero esse tipo de pensamento uma grandessíssima ignorância e a expressão moldar muito grotesca.

Considero muito egoísmo pensar nisso, pois nem filho biológico a gente molda. Sei que podemos educar, passar um bom exemplo, crescer ao lado desde filho, mas moldar me parece uma palavra que vem acompanhada da frase: “Eu te adoto, mas você deverá ser do jeito que eu quero!”.

Pura ilusão, não só porque nem filho biológico se molda, mas também porque os bebês adotados já vêem com uma história intra ulterina. Ninguém pode nos dar garantia de nada, nem de que uma pessoa será boa ou má, até porque esta classificação simplista é estúpida.

O ser humano se constrói de modo complexo e particular a cada um, a cada história, a cada modo de ver e sentir o mundo. O ambiente e os estímulos contidos nele serão muito mais importantes. Concentrem-se nisto, em dar a teu filho o melhor. Seja firme, se permita amadurecer com a experiência também e tenha a certeza que ele te aceitará do jeito que você é e sentirá amor por você se ele também se sentir verdadeiramente aceito. Ele irá querer ser como você e o achará a melhor pessoa do mundo, mesmo sabendo que tem tuas falhas e sabemos que todos nós temos muitas, não é?

Vamos tirar nossas máscaras, comecemos por aqui e tudo fica mais fácil. Ninguém é perfeito nem do jeito que queremos, tudo é aceitação, exemplo e diálogo, só assim exercitaremos o amor, através do respeito. Nós todos já viemos nos moldes de Deus.

Por Cintia Liana

sábado, 24 de julho de 2010

Trabalhando na Itália com Adoção Internacional

Foto: Cintia Liana em 2008 (publicação da foto devidamente autorizada pelos pais).

Início deste mês fui convidada pela presidente de uma entidade italiana para atuar com adoção internacional. Serei orientadora das adoções brasileiras por casais italianos.

A ONLUS, Adozione Senza Frontiere*, existe desde 1982 e é uma entidade muito séria e respeitada aqui na Itália. Tem permissão para atuar na Colômbia e Brasil e as pessoas que nela trabalham demonstram ter uma real preocupação com as crianças, seu bem estar e educação, inclusive após a adoção, quando acompanham as famílias em toda a sua adaptação a nova realidade e o que venha ter necessidade depois.

Estou muito motivada e feliz, pois terei em trabalho voltado para a conquista de espaço. Abrirei novos caminhos no Brasil para que mais crianças sejam adotadas e que os processos andam com um pouco mais de agilidade tendo em vista que estão andando a passos lentos e existem estados brasileiros que dizem que não há crianças grandes para serem adotadas, o que causa indignação, pois sabemos que os abrigos estão cheios.

Por caridade, vamos olhar nossas crianças!

Nesta minha nova empreitada peço a ajuda de todos, contatos e boa vontade de pessoas que queiram ajudar crianças a se tornarem adultos inseridos em suas famílias e realizados na vida.

*www.senzafrontiere.org.it

Por Cintia Liana

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Cordel: Os pais já não podem dar palmadas em seus filhos!

Foto: Google Imagens

ECA!! 20 ANOS

(A arte serve para nos fazer refletir. Mesmo alguns não concordando com a posição de alguns profissionais acho que devemos refletir juntos.)

Por Jotacê Freitas

O Brasil anda pra trás
Nos trilhos da educação
Com a criação do ECA
Houve uma deturpação
Entre direito e dever
Pras crianças da nação.

Se passaram 20 anos
E o ECA só aumentou
Nossa marginalidade
Com o menor infrator
Que é sempre protegido
Faça lá seja o que for.

Querem tudo o que veem
E fazem tudo o que querem
Avisando aos pais
Que nada deles esperem
Até os dezoito anos
Pois assim as Leis proferem.

Muitos pais se preocupam
Em dar boa educação
Para que eles se formem
E tenham uma profissão
Se dedicam com afinco
E poucos lhes dão razão.

Acham que os pais são caretas
E estão ultrapassados
Preferem o mundo das drogas
Serem marginalizados
Em baladas requebrando
Nas ‘paradas’ bem ‘ligados’.

Se for pobre periférico
Os pais têm dificuldades
Para mantê-los em casa
Com suas necessidades
Pois sem o pão de cada dia
Não se tem felicidade.

Mandam eles pra escola
Por mera obrigação
Ou se livrar do ‘problema’
Ter quem preste atenção
Não orientam os filhos
Com justa dedicação.

Querem só bolsa família
Por cada filho que têm
Se tornaram dependentes
E ao governo convém
Pois o voto antecipado
É pago com esse vintém.

As mães dizem que não sabem
O que fazer com os filhos
Dizem que já castigaram
De joelhos sobre o milho
Mas meninos e meninas
Não querem andar nos trilhos.

Filhos não as obedecem
Pois não tiveram limites
Na escola não respeitam
A professora que insiste
Em lhes dar educação
Que pra eles não existe.

Qualquer coisa logo dizem
Que vão para o juizado
Pois conhecem seus direitos
Não querem ser perturbados
Saem da sala e não fazem
O dever recomendado.

Brigam o tempo inteiro
E imitam os marginais
Que veem nos noticiários
Ou nos filmes vesperais
Querem até matar polícia
Pois se acham os maiorais.

Ficam pelas sinaleiras
Ou fazendo avião
Menininhas imaturas
Já na prostituição
Alegando para todos
Que é sua profissão.

Os pais estão sem controle
E precisam aprender
A lidar com o problema
Antes dos filhos crescer
E virarem marginais
Como estamos a ver.

É claro que muitos pais
Exageram no castigo
Punem com espancamento
E aí está o perigo
Contra o pequeno indefeso
E isso não é preciso.

Quebrar dentes com um murro
Ou deixar com o olho roxo
Queimá-los com o cigarro
Por causa de um muxoxo
Marcá-los com a fivela
E até deixá-los coxos.

Existem alternativas
Como cortar diversão
Bicicleta vídeo-game
Recreio Televisão
Que nem sempre funcionam
Dar limite é a solução.

Um tapinha no bumbum
A parte mais recheada
Por Deus feita para isto
Pra levar boas palmadas
Contra a desobediência
Da criança malcriada.

Um bolo em cada mão
Também é forma decente
Como um puxão de orelha
Para o desobediente
Que depois que chora um pouco
Volta pro colo contente.

Dizem que essa nova Lei
É pra não banalizar
A violência que existe
Pra criança não afetar
Mas não sei como permitem
A TV funcionar.

Um ditado popular
Diz que é melhor que a mãe bata
No seu filho queridinho
Pois mão de mãe não maltrata
Pior é ir pra cadeia
Ou o traficante que mata.

As mães mais experientes
Dizem que é melhor bater
Do que apanhar um dia
Do filho que viu nascer
Nessa inversão de valores
Que querem estabelecer.

Maioridade penal
Precisa ser reduzida
Em país civilizado
Que valoriza a vida
Criança que rouba e mata
Também tem que ser punida.

As instituições que dizem
Proteger o ‘de menor’
Preferem eles nas ruas
Vivendo numa pior
Se drogando e roubando
Sem uma opção melhor.

Até mesmo orfanatos
Evitam a adoção
De crianças por estrangeiros
Pra não perder a porção
Do dinheiro do governo
Que vem pra manutenção.

Acredito que quem fez
Essa Lei só pode ser
Um maluco sem juízo
Ou nunca chegou a ter
Um filho em sua vida
Por isso a quis fazer.

Congressista Deputado
Ou Ilustre Senador
Lembrem das suas infâncias
Quem foi que nunca apanhou
Da mamãe ou do papai
E vilão não se tornou?

Eu mesmo já apanhei
De cinto e de vassoura
E sempre amei os meus pais
Respeitei a professora
Não me senti oprimido
Nem tive vida opressora.

O Brasil tem mais problemas
Pra vocês se preocuparem
Corrupção desemprego
Leis para vocês mudarem
Para punir os bandidos
E não nos atormentarem.

Em vez de gastar dinheiro
Com uma copa do mundo
Onde a corrupção desvia
Para um buraco fundo
Criem escolas integrais
Com um ensino fecundo.

E os meninos de rua
Precisam ser acolhidos
Em internatos decentes
Que não os tornem bandidos
Mas cidadãos conscientes
Trabalhadores polidos.


Por Jotacê Freitas
oficinadecordel.blogspot.com
edtapera@bol.com.br
Salvador - Bahia
14 de julho de 2010

Jotacê Freitas é professor da rede Pública Municipal de Salvador-Ba, escritor e cordelista respeitado, filho da cidade de Senhor do Bonfim-BA.
Ele é marido de minha mae e grande amigo meu, pessoa que admiro muito e respeito.

Por Cintia Liana

terça-feira, 20 de julho de 2010

Adoção Consensual ou Intuito Personae

Foto: Luz Art. Google Imagens.

Adoção "à brasileira" é aquela onde se registra a criança como sua filha biológica. Esta modalidade de “adoção” é crime previsto em lei. Se descoberta depois os responsáveis podem ser indiciados, responder a processo penal e podem ser presos.

Já a adoção consensual ou intuito personae é aquela onde a criança é entregue por sua família natural diretamente para aos interessados em adotá-la e estes, por sua vez, se dirigem a uma vara da infância para efetuar a adoção. Esta modalidade não é crime, mas já não é vista com bons olhos por muitos Juízes de comarcas brasileiras.

Alguns genitores alegam que desejavam entregar a criança para pessoas indicadas por conhecidos e que assim estariam mais tranqüilos em torno da segurança do filho e em menor culpa ao doá-lo para alguém de procedêcia conhecida. Mas outros fazem uma tentativa de chantagem com as pessoas que estão ansiosas por adotarem seu filho a qualquer custo, o que se torna um perigo que pode se transformar numa guerra perante o Juiz.

Como psicóloga, com larga experiência em VIJ (Vara da Infância e Juventude), não aconselho adoções consensuais por um motivo evidente: esta modalidade de adoção, de algum modo, pode influenciar a venda de crianças e isso, por sua vez, contribuiria para a volta de tráfico de órgãos.

Sou totalmente a favor do que chamam de “busca ativa”. Habilitados que fazem contatos com pessoas que sabem de crianças em poder do Judiciário, que muitas vezes estão esquecidas em abrigos, e comunicam ao Juiz desta possibilidade, mas ficar buscando crianças que serão ou estão sendo doadas por seus genitores é outra coisa.

Interessados em adotar, ao chegar com uma criança doada pelos genitores alguns juízes entregam esta criança para o primeiro da filha de sua comarca, ou a abrigam, após obviamente verificar a procedência da criança e o eventual interesse que sua família extensa de origem desejar obter a guarda do menor, como avós ou tios.

É previsto no ECA que é de direito da crianças permanecer em sua família de origem e quando esta possibilidade é esgotada é que se busca a adoção como medida de substituição plena desta.

Os juízes não vêem a adoção consensual com bons olhos porque não têm como saber o que de fato ocorreu no trâmite daquela doação. Eles hoje vêem assim por existir pessoas com todo o tipo de escrúpulo. Você pode ser alguém honesto, tentando ajudar, sentindo que encontrou teu filho tão esperado, mas a justiça não tem como saber ao certo se não houve a compra da criança e ele sabe que tem muitas outras pessoas devidamente habilitadas na fila de espera.

Sabemos que cada caso é muito especial, mas para tudo correr dentro da lei e as crianças não correrem nenhum tipo de risco é mais acertado e melhor os genitores entenderem que não é crime entregar o filho para a adoção e as pessoas interessadas em adotar devem esperar a criança através da VIJ, mesmo fazendo a “busca ativa”, assim as nossas crianças estarão bem mais seguras.

Reflitam, não é só você que busca um filho, são milhares de pessoas, e se todas buscarem fora da lei virará uma grande bagunça e as crianças estarão em risco, serão vendidas e irão para mãos de pessoas más que não terão o intuito de adotá-las e sim de fazerem mal. Parece muito egoísmo ficar pensando em satisfazer o próprio desejo de ter um bebê e passar por cima de tudo, esta pessoa não está pronta para educar e nem para amar. Se não consegue pensar na proteção das crianças órfãs porque pensará de modo maduro em seu filho? O amor começa no próximo desconhecido, em qualquer criança. Uma pessoa consciente disso está pronto para adotar um filho, é esta pessoa que nós técnicos da adoção procuramos. A lei é clara, se deve achar uma boa família para uma criança e não uma criança para uma família.

A outra variável é que muitas pessoas vão ter filhos com o intuito de vendê-los, pois verão como algo rentável. Pensem nas crianças que estarão em risco e em não somente satisfazer o teu desejo de ser pai e mãe. Nós sabemos nos proteger, as crianças não.

Entendo que buscando auxílio, trabalhado teu sentimento, tua ansiedade, no momento justo a assistente social te telefonará dizendo que tem uma criança especial para você conhecer.

Por Cintia Liana

Livro da Psicóloga Cintia Liana sobre o percurso de construção da família através da adoção e seus aspectos psicológicos
Para comprar ou visualizar:
http://www.agbook.com.br/book/43553--Filhos_da_Esperanca
(2ª Edição - 2012)

domingo, 18 de julho de 2010

Mitos, Medos e Preconceitos na Adoção de Crianças Maiores

Foto: Google Imagens

Por Jaqueline Araújo da Silva

A adoção está envolvida por preconceitos que se expressam através de medos, crenças, fantasias, inseguranças, entre outros. Como vimos, as pessoas interessadas em adotar optam pelos recém-nascidos ou crianças com idade menor possível. Em pesquisa realizada por Levy e Féres- Carneiro (2001), verificou-se que quando os requerentes optam pelas crianças com a idade menor possível para adotar com a justificativa de que estes são mais fáceis de serem moldados, na verdade, revelam um desejo de apagar a história passada da criança e cancelar qualquer possível herança genética que venha interferir no projeto de parentalidade.

Para Camargo (2006), os requerentes à adoção sonham acompanhar integralmente o desenvolvimento físico e psicossocial, que se manifestam desde as primeiras expressões faciais, além das primeiras falas e passos. Querem construir uma história familiar e registrá-la a partir dos primeiros dias de vida do filho. Além disso, temem que a criança com idade superior a dois anos possa não se adaptar à realidade de uma família adotante. Acreditam que a personalidade da criança já esteja formada, o caráter incorporado e já não são mais possíveis de detê-los. Neste sentido, Santos (1997) afirma:

Este é outro mito na adoção, que eventuais problemas comportamentais apresentados pelos filhos adotivos decorrem [...] do meio social onde a criança viveu seus primeiros anos (nos casos de adoções tardias) e, neste caso, evita-se o problema adotando-se recém nascidos. (SANTOS, 1997, p.163)

Segundo Camargo (2006, p.91), "[...] os mitos, que constituem a atual cultura da adoção no Brasil, apresentam-se como fortes obstáculos à realização de adoções de crianças maiores, pois potencializam crenças e expectativas negativas ligadas à prática da adoção tardia". De acordo com Vargas (1998), o preconceito social em relação à adoção de crianças maiores é fator determinante para a pouca disponibilidade de candidatos para estas adoções, pois a adoção continua sendo mais aceita quando atende a uma necessidade "natural" de um casal com impedimentos para gerar filhos, desde que estes sejam bebês e ''passíveis de serem educados".

O preconceito com relação à adoção de crianças maiores é ainda muito forte, como se todas as adoções de bebês fossem indicativos de sucesso garantido e todas as adoções de crianças maiores já representassem um fracasso (WEBER E KOSSOBUDZKI, 1996; LEVY E FÉRESCARNEIRO, 2001). Weber (1998) afirma que essas adoções nem sempre trazem problemas, porém elas são diferentes das adoções de bebês, uma vez que as crianças maiores têm um passado que, muitas vezes, deixou suas marcas. Esta autora realizou pesquisa com pais e filhos adotivos e também com a população em geral, sendo que os dados levantados indicam o grande número de preconceitos envolvendo a adoção. De acordo com o levantamento de dados:

1- as pessoas teriam medo de adotar crianças maiores (acima de seis meses) devido à
dificuldade de educação;
2- teriam medo de adotar uma criança que viveu muito tempo em acolhimento institucional pelos "vícios" que traria consigo;
3- teriam medo de que os pais biológicos pudessem requerer a criança de volta;
4- teriam medo de adotar crianças sem saber a origem de seus pais biológicos, pois a
"marginalidade" dos pais seria transmitida geneticamente;
5- pensam que uma criança adotada, cedo ou tarde, traz problemas;
6- acreditam que a adoção beneficia, primordialmente, o adotante e não a criança, sendo um último recurso para pessoas que não conseguem ter filhos biológicos;
7- acreditam que a adoção pode servir como algo para "desbloquear algum fator
psicológico" e tentar ter filhos naturais;
8- acreditam que, quando a criança não sabe que é adotiva, ocorrem menos problemas;
assim, se deve adotar bebês e "fazer de conta" que é uma família natural;
9- acreditam que as adoções realizadas através dos Juizados são demoradas, discriminatórias e burocráticas e recorreriam à “adoção à brasileira" caso decidissem;
10- finalmente, consideram que somente os laços de sangue são "fortes e verdadeiros".

Levinzon (2000) também realizou pesquisa com as famílias adotantes e os dados encontrados foram similares aos de Weber (1998). Levinzon destaca os seguintes  medos que comumente habitam o imaginário dos pais adotivos:

1- medo em relação aos pais biológicos da criança: temor que se arrependam a qualquer momento e venham lhe tomar a criança; culpa por tomar para si uma criança cujo sangue não lhes pertence; vergonha, como se tivessem cometido um delito, tendo roubado a criança;
2- medo em relação à criança: medo de que tenha uma má herança biológica; temor de
rejeição e abandono pela criança quando souber de sua verdadeira origem; medo de que a criança vá à procura dos pais biológicos;
3- medo em relação à sociedade: temor de serem censurados pela sociedade; discriminados pela ausência do processo biológico da gestação; desvalorizados por esta forma atípica de parentalidade ou sua compensação na exaltação de seu aspecto filantrópico.

Através destas pesquisas podemos constatar que dentre os inúmeros mitos que povoam o imaginário social e que constituem a atual cultura de adoção, o mito dos laços de sangue é, sem dúvida, o mais dominante, pois insere a crença de que o fator biológico gera o destino final e quase sempre trágico nos casos da adoção. Há, em torno do filho por adoção, fantasias de que ele pode ser “sangue ruim” e, consequentemente, motivo de preocupação e sofrimento para os pais adotivos. O fato de ser adotado parece que já é condição mais que suficiente para ser classificado como problemático, diferente e fora do normal.

Há uma tendência presente no imaginário social em acreditar numa certa garantia decorrente dos laços de sangue e numa fragilidade dos laços formados através da adoção. As fantasias sobre a importância "da descendência de sangue" proporcionam condições para a confusão e discriminação entre a parentalidade biológica e adotiva, atribuindo maior relevância à primeira (WEBER, 1998). Na verdade, os dois tipos de parentalidade têm exatamente a mesma importância, mas fazem parte de contingências diferentes. No entanto, a contingência de ser uma família adotiva traz características especiais que não devem ser negadas, mas, ao contrário, assumidas.

Ainda sobre o preconceito, além do imaginário social, a própria legislação brasileira, conforme debatemos no segundo capítulo, parece contribuir para o fortalecimento dos mitos de que os laços biológicos são aqueles verdadeiros. Assim, os pais adotantes tentam disfarçar ou esconder as relações adotivas e imitar uma família biológica, adotando crianças recém-nascidas e de cor semelhante a sua.

No meio científico também encontramos muitos preconceitos relacionados à adoção. Segundo Weber (2003) e Vargas (1998), as publicações científicas sobre o tema falam acerca das dificuldades encontradas em filhos adotivos. Relatam um ou dois casos de algum distúrbio e atribuem sua etiologia ao fato de a criança ser adotiva, pois a perda inicial dos pais biológicos seria irreparável e causadora de todos os problemas.

Concordamos com Zornig e Levy (2006) quando afirmam que a separação da figura materna para crianças de pouca idade, assim como o desinvestimento materno repentino, produzem efeitos traumáticos. No entanto, ressaltam a possibilidade de as crianças e os pais adotivos conseguirem criar recursos psíquicos surpreendentes. Para estas autoras, a ênfase na qualidade das relações iniciais entre a criança e seus pais deu margem à crença de que crianças abandonadas e/ou vítimas de maus tratos seriam problemáticas e, portanto, não adotáveis tardiamente.

Palácios e Sánchez (1996) realizaram uma investigação comparativa com 865 crianças entre quatro e dezesseis anos de idade, provenientes de três grupos: crianças adotadas, crianças não-adotadas da mesma região de origem das adotadas e crianças institucionalizadas. As comparações foram realizadas em três áreas: problemas de comportamento, auto-estima e rendimento acadêmico. Os resultados mostraram uma grande semelhança entre os adotados e os não-adotados, enquanto que as crianças institucionalizadas obtiveram os piores resultados no conjunto das comparações.

Através de um estudo comparativo entre um grupo de pais e filhos adotivos e outro de pais e filhos biológicos, Santos (1988) avaliou aspectos como afetividade e cooperação entre pais e filhos. Não encontrou diferenças significativas entre eles.

Em relação a adoção de crianças maiores, Weber (2003) realizou pesquisa com pais e filhos adotivos de todo o Brasil e não constatou que a idade avançada da criança no momento da adoção fosse possível fonte de problema. Os casos em que foram relatados problemas no processo adotivo estavam mais relacionados à revelação tardia da adoção para a criança do que outros fatores. Esse assunto será aprofundado no próximo capítulo quando dissertamos sobre a família adotante.

No que se refere à diferença de comportamento entre crianças adotadas quando recémnascidas e adotadas quando maiores de dois anos, Ebrahim (2000) afirma não existir uma relação direta entre problemas de comportamento e idade da criança na época da adoção. Sustenta que as adoções de crianças maiores são perfeitamente viáveis e sua concretização e manutenção dependem, entre outros aspectos, da história da criança, do fato dela desejar ou não a adoção e das ações dos pais adotivos e dos que os cercam. Corroborando este pensamento, Diniz (1994) afirma que, apesar dos primeiros meses de vida serem os mais indicados para a formação de uma relação parental substituta, isto não exclui a possibilidade da adoção de crianças maiores. A concretização da adoção dependerá da vivência da criança e dos motivos que a impossibilitaram de permanecer na sua família biológica, bem como da flexibilidade e capacidade de dedicação dos pais adotivos. Segundo o autor, o fato de a criança ter mais idade não é um elemento inviabilizador da adoção.

Levy (1999) argumenta que, por já ter vivido experiência de abandono da qual muitas vezes se lembra, a criança maior será mais ativa no processo, podendo adotar ou não os pais adotivos como pais. Andrei (2001) também ressalta que quanto mais tardia a adoção, mais vivas serão as lembranças do passado e mais enraizadas na sua memória as ilusões, os sonhos, os desejos e as frustrações dos anos de abandono. Esta autora ainda afirma que as pessoas imaginam a adoção em termos ideais. De um lado, a criança adotada extremamente grata e com o coração transbordante de amor; do outro lado, a família sentindo-se plenamente realizada e recompensada através do seu novo membro. Às vezes, é exatamente essa a situação que ocorre. Outras vezes, o fardo do passado influenciando o comportamento da criança e a surpresa da família diante de manifestações decepcionantes tornam a adoção mais parecida com um desafio.

Ainda nesta discussão, Ferreira (1994) diz que muitas vezes, é exigida da criança recémintegrada uma conduta mais correta do que a de qualquer outra criança, como se o fato de ter ganho uma família significasse a retribuição de uma automática docilidade, educação e bom comportamento. Os pais adotivos esperam atitudes adequadas e resultados imediatos, submetendo a criança a exigências exageradas, que, não podendo ser correspondidas, acabam por produzir um total desajuste em sua conduta.

Sem dúvida, como foi mencionado, a adoção de crianças maiores requer cuidados especiais, porque a criança já traz a marca do abandono inicial e do tempo que permaneceu em acolhimento institucional. Contudo, isto não quer dizer que não sejam possíveis a superação e a adoção mútua entre as crianças e os pais adotivos. Para Vargas (1998), na adoção de crianças maiores, as chances de sucesso ou fracasso das relações que se estabelecem no meio social dependem da capacidade de suporte, trocas afetivas, confiança e companheirismo entre os protagonistas. A procura por uma orientação ou um processo psicoterapêutico pode ser valiosa, auxiliando a família a encontrar um eixo comum que proporcione desenvolvimento.

Assim, é preciso desmistificar a associação errônea entre adoção e fracasso, mito de laços sanguíneos, herança genética entre outras distorções. Na verdade, a adoção não é um processo artificial, falso ou ilegítimo; pelo contrário, envolve relações humanas de afeto e amor que florescem a partir da reciprocidade entre o adotado e a família adotante. Neste sentido, Santos (1997, p. 164) afirma que “[...] faz-se necessário, iniciar um trabalho voltado para a mudança de mentalidade no que se refere à adoção de modo a possibilitar uma superação de pelo menos parte dos equívocos e preconceitos que envolvem este processo”.

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERA
Programa de Pós-graduação em Psicologia
"ADOÇÃO DE CRIANÇAS MAIORES:
Percepções e Vivências dos Adotados"
Jaqueline Araújo da Silva
Belo Horizonte
2009

 
Por Cintia Liana

sexta-feira, 16 de julho de 2010

A importância das primeiras relações

Foto: Google Imagens

Por Evanisa Helena Maio de Brum e Lígia Schermann


Numa perspectiva histórica, encontramos o início do estudo das primeiras relações no trabalho de Freud. Em seu artigo "Instintos e suas vicissitudes", escrito em 1915, argumenta que a criança possui necessidades fisiológicas que devem ser satisfeitas, sobretudo de alimento e conforto, e que o bebê se torna interessado em uma figura humana, especificamente a mãe, por ela ser a fonte de sua satisfação. Na teoria dos instintos, a vinculação com a figura materna é vista como impulso secundário, ou seja, que o bebê se liga à mãe afetivamente como conseqüência de esta ser o agente de suas satisfações fisiológicas básicas.

Outro estudioso das relações vinculares e da formação do apego é o psicanalista René Spitz. Trabalhando em um orfanato, Spitz (1945) observou que os bebês que eram alimentados e vestidos, mas não recebiam afeto, nem eram segurados no colo ou embalados, apresentavam a síndrome por ele denominada hospitalismo. Esses bebês tinham dificuldades no seu desenvolvimento físico, faltava-lhes apetite, não ganhavam peso e, com o tempo, perdiam o interesse por se relacionar, o que levava a maioria dos bebês ao óbito. René Spitz descreveu, portanto, o resultado da ausência dos pais e do afeto como fator determinante no desenvolvimento com prognóstico reservado.

Erik Erikson, psicanalista e teórico de grande influência sobre o estudo do desenvolvimento, em seus trabalhos desde 1950 até 1985, partilha de alguns aspectos da teoria de Freud, embora existam diferenças fundamentais entre suas teorias. Erikson (1980) aborda a grande importância dos anos iniciais para o desenvolvimento, porém, não deu ênfase à centralização dos instintos e impulsos, focalizando, em seu lugar, o surgimento gradativo de um senso de identidade que ocorre pela interação do sujeito com seu meio ambiente. O primeiro dos oito estágios apresenta a crise de confiança básica versus desconfiança. Expõe que nele o comportamento do principal provedor de cuidados (comumente, a mãe) é fundamental ao estabelecimento, pela criança, de um senso de confiança básica. Para que ocorra uma finalização bem-sucedida dessa tarefa o genitor precisa amar com consistência e reagir de maneira previsível e confiante para com a criança. Aqueles bebês cujos cuidados iniciais foram erráticos ou severos podem desenvolver desconfiança. Seja qual for o caso, a criança carrega esse aspecto de identidade básica ao longo de seu desenvolvimento, influenciando a solução das tarefas contidas nos estágios posteriores.

Winnicott, psicanalista inglês e teórico das relações objetais, em 1963, descreveu o desenvolvimento emocional primitivo em termos da jornada da dependência à independência, propondo três categorias: dependência absoluta, dependência relativa e autonomia relativa. Para ele, é na fase de dependência absoluta que a mãe desenvolve o que chamou de preocupação materna primária (Winnicott, 1956). Este estado especial da mãe faz com que ela seja capaz de compreender o bebê por meio de uma surpreendente capacidade de identificação, constituindo-se com ele em uma unidade. A mãe, então, auxilia-o a se integrar. Diz o autor que, se na fase de dependência absoluta, não há uma mãe capaz de se conectar com seu bebê, este fica num estado de não-integração, tornando-se apenas um corpo com partes soltas. De acordo com as idéias acerca do desenvolvimento propostas por Winnicott, é aqui que ocorrem as falhas primitivas no desenvolvimento, acarretando o surgimento de patologias mentais.

Bowlby (1969), psicanalista inglês e teórico das relações objetais, descreveu a importância das primeiras relações para o desenvolvimento, formulando, desse modo, a teoria do apego, quando descreve as relações do bebê com sua mãe ou cuidador desde o nascimento até os seis anos de idade. Alude que o ser humano herda um potencial para desenvolver determinados tipos de sistemas comportamentais, como sugar, sorrir, chorar, seguir com os olhos. A conduta instintiva é o resultado do controle desses sistemas comportamentais integrados, que funcionam num determinado ambiente de adaptabilidade evolutiva, em especial, de sua interação com a principal figura deste ambiente, a mãe. Nesta perspectiva, o vínculo da criança com a mãe, chamado por ele de apego, tem uma função biológica que lhe é específica e é o produto da atividade destes sistemas comportamentais que têm a proximidade com a mãe como resultado previsível. Portanto, ao longo do desenvolvimento, a criança passa a revelar um comportamento de apego que é facilmente observado e que evidencia a formação de uma relação afetiva com as principais figuras deste ambiente.

Nessa formulação, não há referência a necessidades fisiológicas e impulsos, sustenta-se ainda que o ato de nutrir desempenha um papel apenas secundário no desenvolvimento desses sistemas comportamentais. Desta forma, torna-se claro que, para Bowlby, a formação do apego não é uma conseqüência da satisfação das necessidades fisiológicas básicas como postula Freud.

Esta descrição de Bowlby coincide com as formulações de Spitz acerca da síndrome de hospitalismo, ou seja, é necessária a existência de uma relação de afeto e de apego como fator primário para um adequado desenvolvimento. Também encontramos respaldo sobre esta questão na teoria psicossocial do desenvolvimento de Erikson, por este autor não se centrar na teoria instintiva freudiana.

Bowlby e Winnicott deixam clara a importância das primeiras relações de um bebê com sua mãe para o desenvolvimento, apesar de haver divergência em pontos importantes na teoria de cada um deles. Estar apegado a uma figura materna (conceito de Bowlby) e ser dependente de uma figura materna (conceito de Winnicott) são coisas muito diferentes, apesar de terem como base a relação vincular mãe-bebê. Nas primeiras semanas, não há dúvida de que um bebê é dependente de sua mãe para que possa sobreviver, mas não está ainda apegado a ela. De acordo com as idéias de Winnicott, a dependência é máxima no nascimento e tende a diminuir ao longo da vida, apesar de seguir sempre de alguma forma presente. Na teoria de Bowlby, o apego está ausente no nascimento e começa, com os meses, a adquirir força. Bowlby (1969) infere que é improvável que qualquer fase sensível de apego comece antes das seis semanas. Acrescenta que o apego torna-se evidente depois que a criança completa seis meses, ficando mais clara sua existência por volta dos 18-24 meses. Portanto, os dois conceitos estão distantes de serem sinônimos.

Bowlby (1969) afirma que existem boas provas de que, num contexto familiar, a maioria dos bebês de cerca de três meses de idade já responde à mãe de um modo diferente em comparação com outras pessoas. Quando vê sua mãe, um bebê desta idade sorrirá e vocalizará mais prontamente e a seguirá com os olhos por mais tempo do que quando vê qualquer outra pessoa. Portanto, a discriminação perceptual está presente. Entretanto, será difícil afirmar que existe comportamento de apego enquanto não houver provas evidentes de que o bebê não só reconhece a mãe, mas também tende a se comportar de modo a manter a proximidade com ela.

O comportamento de apego manifesta-se pelos três meses, tornando-se nitidamente presente por volta dos seis meses de idade da criança e, em regra, prossegue até a puberdade.

Até recentemente, a maioria dos teóricos das relações objetais, em seus estudos sobre interação mãe-bebê, examinou fatores referentes ao papel da mãe neste processo, enquanto menos atenção foi dada às contribuições da criança. Não há dúvida de que a mãe possui, sim, a tarefa de se ligar ao bebê e auxiliá-lo em seu desenvolvimento. Porém, sabemos, hoje, com o respaldo de pesquisadores contemporâneos, que ao bebê também cabe esta tarefa e que este possui recursos para enfrentar tal empreitada. Esta interação, portanto, segue um modelo bidirecional (Schermann, 2001b), em que não apenas o comportamento do bebê é moldado pelo comportamento da mãe, mas também o da mãe o é pelo comportamento do bebê.

Autores e pesquisadores contemporâneos, como Brazelton (1988), Schermann et al. (1994), Schaffer (1996), Wendland-Carro et al. (1999), Klaus & Kennell (2000), Claussen & Crittenden (2000) e Schermann (2001b), abordam o quanto os bebês recém-nascidos apresentam uma impressionante capacidade de responder às interações já nos primeiros minutos. Iniciam a vida capazes de fazer discriminações importantes e de localizar objetos por meio de várias indicações perceptivas. São capazes de realizá-las pelo olhar, de identificar a voz do pai e da mãe. Pelo sexto dia de vida, um bebê já é capaz de identificar o cheiro da mãe. O paladar também é altamente desenvolvido em bebês após o nascimento. Eles gostam do conforto, da proximidade, e irão com freqüência moldar-se ao corpo de seus pais. Portanto, estes pesquisadores corroboram ao que postulam Bowlby e Ainsworth sobre a existência de uma relação vincular estreita entre o bebê e sua mãe já nas primeiras horas de vida, enfatizando as capacidades do recém-nascido para a interação.

Schaffer (1996) diz que a criança com quatro semanas já se comporta diferentemente com sua mãe, seu pai e com estranhos. Expressões emocionais, rapidez de movimentos, responsividade, tensões e brincadeiras são estes e muitos outros atributos que diferenciam as pessoas e ajudam a produzir estilos distintos de interações. Complementa que as características temperamentais da criança, que são inatas, até mesmo em crianças muito novas, ajudarão a determinar o curso da interação e influenciarão o comportamento da outra pessoa.

Nesse sentido, Bee (1997) cita que, mesmo sendo tão importante, esse programa inato das capacidades da criança depende da presença de um ambiente mínimo esperado, sendo essencial a formação do elo afetivo e da oportunidade de pais e bebês desenvolverem um padrão mútuo de entrosamento de comportamento de apego.

O trabalho de Ainsworth et al. (1978) foi fundamental na identificação dos diferentes padrões de apego, classificação que foi possível ser formulada através da "situação estranha", um procedimento que foi elaborado especialmente para este fim. Consiste, resumidamente, em uma série de sete episódios em laboratório: a criança, inicialmente, está com a mãe, depois, com a mãe e um estranho, sozinha com o estranho, reunida à mãe; sozinha; e, depois, de novo, reunida com o estranho; e, então, com a mãe. Ainsworth sugeriu que as reações das crianças a essa situação poderiam ser classificadas em três tipos: seguramente apegados à mãe (70% da amostra); ansiosamente apegados à mãe e esquivos (20% da amostra); e ansiosamente apegados à mãe e ambivalentes (10% da amostra). O estabelecimento dos distintos padrões de apego vai depender, em grande parte, da sensitividade materna às necessidades infantis, assim como, a capacidade da criança de usar a mãe como base segura, a partir da qual explora o mundo e para onde retorna em situação de perigo ou angústia.

Sensitividade materna, de acordo com Ainsworth et al. (1978), é a habilidade da mãe em perceber, interpretar e responder de forma adequada e contingente aos sinais da criança. A mãe muito sensitiva é bastante atenta aos sinais da criança e responde a eles pronta e apropriadamente. No outro extremo, está a mãe muito insensitiva, que parece agir quase que exclusivamente de acordo com seus desejos, humores e atividades, podendo responder aos sinais do bebê, mas fazendo-o com atraso.

Schaffer (1996) e Claussen & Crittenden (2000), partindo das definições de Ainsworth e Bowlby, dizem que, embora o conceito de sensitividade materna tenha suporte em pesquisa, sua definição não é clara. Segundo Claussen e Crittenden, isso ocorre devido ao fato de este conceito abarcar duas questões distintas: primeiramente, a interpretação dos sinais da criança (sensitividade) e, depois, a adequada execução de respostas (responsividade). Dizem que, na escala original de Ainsworth, sensitividade incorpora ambas habilidades, tanto para perceber e interpretar acuradamente os sinais da criança quanto para responder apropriadamente e prontamente a esses sinais. Destacam que, conceitualmente, isso é problemático, pois esses são passos diferentes no processo de informação e formação de vínculos afetivos, não estando necessariamente vinculados.

As autoras acima referidas conceituam sensitividade como uma construção diádica, focalizando o temperamento e as características únicas tanto da criança quanto do cuidador, e não somente como uma característica dos pais. Portanto, alguns pesquisadores têm se concentrado mais no conceito de sincronia da díade, em vez de apenas dos pais, capturando assim a contribuição de ambos, pais e crianças, para a interação.

Desde a década de 1960 esses aspectos vêm sendo estudados; a pesquisa de Schaffer e Emerson, realizada em 1964, com 60 crianças escocesas, tinha o objetivo de identificar as condições associadas ao fato de o bebê apegar-se à mãe num alto ou baixo grau de intensidade, medida pelos seus protestos quando a mãe se afastava. Os pesquisadores concluíram que nas crianças com alta intensidade de apego às mães não havia associação significativa com as variáveis alimentação, desmame, treinamento dos hábitos de higiene, sexo da criança, ordem de nascimento e quociente de desenvolvimento. Em contrapartida, duas variáveis, relacionadas ao apego e que envolvem o conceito de sensitividade materna, destacaram-se como claramente significativas: a presteza com que a mãe respondia ao choro do bebê e o grau com que ela própria iniciava a interação social com ele.

Mais recentemente, Wendland-Carro et al. (1999) estudaram 36 mães parturientes e seus recém-nascidos, examinando uma intervenção que analisa a influência da resposta sensível da mãe para o seu bebê. Um grupo experimental recebeu um programa de intervenção desenvolvido para incrementar a interação entre mãe-filho. Foi apresentado um vídeo com informações acerca das competências dos recém-nascidos para interação, motivando as mães a se envolverem e interagirem mais intensamente com seus filhos. Os pesquisadores procuraram direcionar a atenção da mãe para a importância da descoberta da individualidade da criança no tocante ao temperamento, à preferência para o contato físico e à reação à situação de pressão. Um segundo grupo recebeu uma intervenção, também em forma de vídeo, com informações que davam ênfase à habilidade de cuidados básicos. Um mês após, foi feita uma observação na casa dos bebês para avaliar a sincronia e a assincronia entre mãe e filho. O primeiro grupo mostrou uma grande freqüência no tocante às ocorrências sincrônicas que envolviam as trocas vocais, observação dos parceiros e contato físico. Havia, também, nesse grupo, diferenças positivas na responsividade das mães para com o choro e a resposta involuntária da criança.

Acredita-se, portanto, que a qualidade da interação inicial mãe-bebê é um importante fator mediador entre os eventos perinatais e o desenvolvimento sociocognitivo da criança (Schermann, 2001a). Outros pesquisadores, também, argumentam que os primeiros meses de vida da criança são primordiais para o desenvolvimento da conduta de apego entre o bebê e sua mãe (Bowlby, 1969; Ainsworth et al., 1978; Schaffer & Emerson, 1964; Brazelton, 1988; Bee, 1997; Wendland-Carro et al., 1999; Klaus & Kennell, 2000 e Claussen & Crittenden, 2000). Sendo que quando há o desenvolvimento de apego seguro, como postula Ainsworth et al. (1978), tem-se a idéia de um importante fator no bom prognóstico do desenvolvimento afetivo, social e cognitivo de crianças.

De acordo com o que foi até aqui descrito, as crianças com apego seguro, ou que rumam à independência, têm confiança no amor de seus pais, sabem que podem confiar neles para compreender e satisfazer suas necessidades e vêem o mundo como um local seguro. A partir da dependência nos primeiros meses e a formação de um apego seguro, ocorre a independência posterior. Os esforços de pais para levarem seus filhos à independência precoce resulta num processo inverso, ou seja, provocam dependência e medos que podem durar a vida toda.

Quando os pais são coerentes em seus padrões de cuidados e prestam atenção aos sinais de seu bebê, oferecem um ambiente altamente favorável para a criança senti-los e ao mundo como confiáveis e responsivos às suas necessidades individuais. Pelo asseguramento repetido de que suas necessidades físicas e emocionais serão satisfeitas, o bebê começa a desenvolver um sentimento de confiança básica e apego que o conduz à construção da independência. Assim, a criança pode usar sua curiosidade, pela base segura formada com seu cuidador, para desbravar e experimentar o mundo.


Vínculos iniciais e desenvolvimento infantil: abordagem teórica em situação de nascimento de risco
Evanisa Helena Maio de Brum; Lígia Schermann
Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva, Universidade Luterana do Brasil. Ciênc. saúde coletiva vol.9 no.2 Rio de Janeiro Apr./June 2004


Por Cintia Liana

quarta-feira, 14 de julho de 2010

O Desenvolvimento Emocional Primitivo

Foto: Google Imagens

Por Sérgio Luiz Saboya Arruda e Elisângela Andrieto

Na teoria de Winnicott, o desenvolvimento emocional primitivo é um tema bastante amplo e complexo. Portanto, neste artigo, não será possível abarcar todas as questões relevantes a este tema, embora se pretenda estudar as principais características dos processos iniciais do desenvolvimento do bebê, enfatizando a importância da mãe nos mesmos.

Para que o bebê se desenvolva emocionalmente, é necessário que alguém o auxilie neste processo, ou seja, é necessária a presença de uma mãe suficientemente boa,que não necessariamente é a própria mãe do bebê, mas alguém que assuma este papel. Isto é:

[...] aquela que efetua uma adaptação ativa às necessidades do bebê, uma adaptação que diminui gradativamente, segundo a crescente capacidade deste em aquilatar o fracasso da adaptação e em tolerar os resultados da frustração. A mãe suficientemente boa, como afirmei, começa com uma adaptação quase completa às necessidades do bebê, e, à medida que o tempo passa, adapta-se cada vez menos completamente, de modo gradativo, segundo a crescente capacidade do bebê em lidar com o fracasso dela. (WINNICOTT, 1971/1975, p. 25)

Para explicar o desenvolvimento emocional de um bebê, Winnicott (1945/1993) assinala a existência de dois estádios que nos aproximam da observação do desenvolvimento primitivo. O “primeiro” ocorre por volta do nascimento, que é percebido pela diferença entre bebês prematuros e pós-maturos. Segundo Winnicott (1945/1993) ao final do nono mês de gestação, o bebê se torna maduro para o desenvolvimento emocional. Se ele nasce após completar nove meses, ele atinge esse estágio ainda no útero; se nasce prematuro não experimenta muita coisa que seja vital até atingir a idade com a qual deveria ter nascido.

O “segundo” estádio acontece entre 5 e 6 meses de vida. É neste estádio que o bebê adquire a habilidade de agarrar um objeto e levá-lo à boca. É por causa desse movimento que é possível dizer que o bebê mostra sua compreensão de que tem um interior e que as coisas vêm de fora, admitindo assim a existência da mãe com um interior próprio. Este estágio em que um ser humano se relaciona com o outro representa um longo caminho no seu desenvolvimento primitivo (WINNICOTT, 1945/1993). Porém o que interessa, neste artigo, é o que ocorre com os sentimentos e com a personalidade do bebê antes o “segundo” estádio, ou seja, antes mesmo de o bebê conhecer a si mesmo (e como consequência os outros) como a pessoa total que ele é (e que eles são). Esta discussão é possível, pois paralelamente a esses estádios observa-se a presença dos processos de integração, personalização: a apreciação do tempo e do espaço e de outras propriedades da realidade (WINNICOTT, 1945/1993). Deve-se enfatizar o que Winnicott pontua a respeito da tarefa do bebê. A ocupação do bebê, pelo menos desde o nascimento, nunca é uma tarefa acabada: as conquistas das primeiras semanas e meses, muitas vezes, são perdidas e recobradas de acordo com as voltas do destino (WINNICOTT, 1948/1993).

É também importante assinalar que, para esta discussão, não devemos pensar no bebê como uma pessoa que sente fome, cujos impulsos instintivos podem ser satisfeitos ou frustrados, mas sim como um ser imaturo que está próximo de sofrer uma ansiedade inimaginável. Essa ansiedade pode ser evitada pela função da mãe que é vitalmente importante nesse estágio, ou seja, sua capacidade de se pôr no lugar do bebê e de saber o que ele necessita no cuidado geral de seu corpo e da sua pessoa. (WINNICOTT, 1965/1983)

No estado de dependência absoluta, as necessidades dos bebês vão desde as necessidades do corpo, como virá-lo no berço, colocar ou tirar mais roupas dependendo da condição do tempo, acariciá-lo ao perceber cólicas, limpá-lo e alimentá-lo, até outro tipo de necessidades muito sutis, que só o contato humano pode satisfazer:

Talvez o bebê precise deixar-se envolver pelo ritmo respiratório da mãe, ou mesmo ouvir e sentir os batimentos cardíacos de um adulto. Talvez seja-lhe necessário sentir o cheiro da mãe ou do pai, ou talvez ele precise ouvir sons que lhe transmitam a vivacidade e a vida que há no outro meio ambiente, ou cores e movimentos, de tal forma que o bebê não seja deixado a sós com os seus próprios recursos, quando ainda jovem e imaturo para assumir plena responsabilidade pela vida. (WINNICOTT, 1970/1994, p. 76)

Essas características dos bebês e de suas necessidades ajudam na compreensão da caracterização dos estádios que compõem o desenvolvimento emocional primitivo.

A integração é um processo que começa desde muito cedo na vida do bebê. Ela é ajudada por dois conjuntos de experiências: o cuidado do bebê, que é caracterizado pelos banhos, pelo manuseio corporal, por nomear as suas partes etc; as experiências pulsionais que tendem a tornar a personalidade una a partir do interior. Há diferenças quanto ao momento da vida em que esse processo ocorre em cada bebê: ora imediatamente após o nascimento, ora em momentos posteriores da vida; podendo até
ocorrerem momentos de recaídas. (WINNICOTT, 1945/1993)

A integração manifesta-se a partir de um estágio primário não integrado, ou seja, o bebê se compõe de uma série de motilidades e de percepções sensoriais que vão sendo identificadas e integradas por causa da percepção e da compreensão que a mãe suficientemente boa tem das necessidades do bebê. No entanto, a volta a um estado não integrado não caracteriza necessariamente uma fonte de medo para o bebê, em virtude do senso de segurança propiciado pela mãe. Isto, às vezes, é identificado por ele, no simples ato de a mãe segurá-lo adequadamente no colo. Situações como essas conservam o bebê como que unido em si mesmo e, desta forma, a não integração e a reintegração podem ocorrer sem provocar ansiedade. (WINNICOTT, 1965/2005)

Outro processo importante que também faz parte do desenvolvimento emocional primitivo é a personalização, que é o sentimento de que se está dentro do próprio corpo. Como a integração, a personalização é ajudada pela experiência pulsional e pelas repetidas e tranquilas experiências de cuidado corporal que a mãe lhe propicia (WINNICOTT, 1945/1993). É pela ocorrência de um grau razoável de adaptação às necessidades do bebê, que é possível estabelecer, mais rapidamente, uma forte relação entre psique e soma (WINNICOTT, 1965/2005).

O terceiro processo que faz parte desse período do desenvolvimento emocional primitivo é a realização, ou seja, o “perceber” a existência do mundo e o relacionar-se com o mesmo. É um processo bastante complexo, que se relaciona com a ilusão e com a fantasia.

Segundo Winnicott (1971/1975), a ilusão é propiciada pela mãe, ou seja, ela oferece ao bebê a oportunidade para a ilusão de que o seio dela faz parte do bebê, ou seja, de que está sob o controle mágico e onipotente do bebê. A onipotência é quase um fato de experiência e a tarefa final da mãe égradativamente desiludir o bebê. Assim, desde o início da vida, o bebê está envolvido com aquilo que é objetivamente percebido e aquilo que é subjetivamente concebido.

Newman (2003) comenta que, de acordo com Winnicott, a fantasia faz parte da defesa maníaca do indivíduo ao lidar com a sua incapacidade para aceitar o pleno significado da realidade interna. A fantasia relaciona-se com os esforços do ser humano para aceitar o mundo interno, podendo-se dizer que o controle onipotente da realidade interna implica fantasias sobre essa realidade. Ou seja, o indivíduo chega à realidade externa por meio de fantasias onipotentes elaboradas como uma tentativa de livrar-se da realidade interna.

Winnicott (1971/1975) também descreve a fantasia como um fenômeno isolado, que absorve energia e cuja inacessibilidade relaciona-se à dissociação. Dessa forma é possível compreender que a ilusão e a fantasia relacionam-se intimamente com o processo da realização, pois são necessárias para a concretude desse processo, uma vez que o bebê precisa sentir primeiro a onipotência, que ocorre pela ilusão e pela fantasia, para que possa compreender a realidade externa.

Assim como já ocorreu na integração e na personalização, o processo de adaptação à realidade externa é ajudado pela interação com a mãe, que apresentará os objetos ao bebê. Este passo no desenvolvimento emocional representa um grande avanço, mas nunca é dado e estabelecido de uma só vez. Para explicar tal processo, Winnicott (1968/1994) destaca o par bebê-seio da mãe. O momento da amamentação não se limita apenas à alimentação do bebê, mas também ao início da relação dele com o objeto. O relacionamento com o mundo real baseia-se na forma como as coisas se iniciam e no padrão que gradualmente se desenvolve, de acordo com a experiência que faz parte desse desenvolvimento humano entre mãe e bebê.

A experiência da amamentação leva a um paradoxo: segundo Winnicott, aquilo que o bebê cria já estava ali. Na verdade, o bebê cria parte da mãe que foi encontrada. Não há uma certeza a respeito da idade na qual o bebê percebe pela primeira vez que a mãe é uma pessoa (WINNICOTT, 1948/1993).

Em suma, Winnicott (1945/1993) enfatiza a importância da participação da mãe quer na adaptação do bebê à realidade, quer em todo o processo do desenvolvimento emocional primitivo. Ela tem o papel de protegê-lo de complicações que o mesmo ainda não entende, bem como de fornecer-lhe pedaços simplificados de mundo, que a criança passa a conhecer por intermédio da mãe. Um bebê não pode existir sozinho, psicológica ou fisicamente, ele necessita realmente de uma pessoa que cuide dele no início da vida, propiciando-lhe um ambiente satisfatório para o seu desenvolvimento, percebendo e atendendo as suas necessidades básicas.

Mães psicóticas e seus bebês: uma leitura winnicottiana
Por Sérgio Luiz Saboya Arruda; Elisângela Andrieto
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), São Paulo, Brasil
Arquivos Brasileiros de Psicologia, v. 61, n. 3, 2009.
Artigo completo em:


Por Cintia Liana

domingo, 11 de julho de 2010

A Verdadeira Maternidade

Foto: Google Imagens

Sou mãe de dois filhos adotivos e me irrito quando dizem que eles não são meus "filhos verdadeiros".

Resposta:
VOCÊ TEM TODA A RAZÃO de se irritar. Um doador de esperma, por acaso, é um pai "verdadeiro" ou é um simples masturbador de material genético? É claro que você vê orgulho nos pais biológicos que também desempenharam a paternidade. Seus filhos têm seus traços, seus trejeitos, suas heranças biológicas. Eles são pequenas miniaturas deles.

A mãe natureza quer esse vínculo, para o benefício das crias. A tolerância de pais biológicos para um "sangue ruim", que a loteria genética lhes produza, será maior do que a de pais adotivos.

Mas, afinal, o que são um pai e uma mãe "verdadeiros"? São aqueles que produzem as condições para que a criança se torne uma pessoa, um indivíduo. São aqueles que desempenharam funções de pai e de mãe (continuação do ventre é igual a nutrição; calor e proteção, função de mãe; apresentação suave para viver no mundo, função de pai). Todas podem ser desempenhadas pela pessoa, quem quer que seja, interessada na criança: mãe, pai, babás, avós, curadores de orfanatos etc.

Quando um embrião se torna um ser humano (desenvolve um sistema nervoso que o permite sentir alguma coisa), vai precisar dessas funções para se tornar uma pessoa. É um trabalho danado, um investimento amoroso enorme. A "verdade" está com quem toma para si tal empreendimento.

Por Francisco Daudt, psicanalista, publicado na Revista da Folha em 27/04/08.


Por Cintia Liana

sábado, 10 de julho de 2010

A Felicidade da Infelicidade

E-mail de uma linda mãe, que tem um filho adotivo e uma filha biológica dois anos mais nova.

Foto: Google Imagens

Ontem eu estava deitada na cama com Bebel. Ela está aprendendo a virar de bruço (imagine a luta dela com os bracinhos!). E ela ria muito pra mim. Leozinho a esta altura já estava no milésimo sono, dormindo no quarto dele. Quando eu estava olhando pra Bebel, com pena da posição em que ela se colocou, e quase ajudando a tirar o braço debaixo da barriga, lembrei que Leozinho chegou com a idade dela pra mim, com 4 meses e 10 dias. Então, foi aí que eu comecei a entender o motivo da revolta de alguns filhos adotivos.

Imagine comigo. Eu sou Bebel. Eu conheço minha mãe, minha casa, meu pai e meu irmão. Sem contar as avós. Aí, eu vou dormir no meu bercinho e de repente acordo com uma outra pessoa me carregando. Eu sorrio, porque sou muito risonha, e brinco com essa pessoa o dia todo. E nada de minha mãe aparecer. Eu começo a ficar enjoadinha, porque quero a minha casa, a minha família. É assim que ela fica quando eu saio o dia todo. É assim que Leozinho fica quando preciso deixar ele na casa de minha mãe e demoro a voltar.

Então comecei a imaginar o arraso que isso seria pra Bebel se eu nunca mais voltasse. Ela iria me procurar, mas não me encontraria. Ela encontraria uma estranha tratando ela com carinho, mas seria uma estranha. Com o tempo, ela iria se acostumar com a minha ausência e com a presença carinhosa da estranha. Como é um bebê, não sabe perguntar, teria algum tipo de reação, como a que Leozinho teve alguns dias depois que veio pra mim: o terror noturno (gritar desesperadamente dormindo e não acordar de forma alguma).

Ela iria crescer, amar a estranha, mas dentro dela o abandono estaria marcado. Porque ela sumiu? Porque eles desapareceram? Ela nunca se faria esta pergunta enquanto bebê, mas quando ela crescesse e soubesse... As perguntas se formulariam automaticamente e se transformariam em: porque me abandonaram com uma estranha? E aí se desencadearia a revolta.

Agora entendo. Enquanto pra mim era um momento de extrema felicidade, pra Leozinho era um momento de grande tristeza. Enquanto eu ficava com um sorriso de um lado a outro do rosto, ele chorava dormindo sentindo a falta da mãe biológica. Eu feliz, e ele infeliz.

O abandono deixou marcas em meu filho, e quando ele tiver plena consciência do que aconteceu com ele, sei que as perguntas virão a tona. Mesmo que ele não expresse, mesmo que ele me compreenda antes de compreender a si mesmo, sei que as perguntas virão. E ele nunca vai ter resposta pra elas.

Criança nenhuma merece passar pelo abandono. Se minha mãe morresse hoje eu ficaria sem rumo. Eu, uma burra-velha de 31 anos de idade. Imagine se ela tivesse “desaparecido” quando eu fosse um bebê. As marcas são profundas demais. Acho que de tão profundas que são as marcas de Leozinho eu não estava conseguindo enxergar.

Ah, o meu amor vai ajudar ele a sarar? Vai, claro! Mas não vai impedir da dor em algum momento vir a tona. Nem impedir que, nem que seja por um milésimo de segundo, ele questione o meu amor.

Bia


Esse texto é maravilhoso para desenvolver várias reflexões.


Por Cintia Liana

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Os olhos do nosso filho

Foto: Facebook

Os olhos do nosso filho
São ainda de cor incerta
Não sei sequer se existem
Vão ser de Deus uma oferta

Existem na minha alma
Cravados no meu semblante
Os olhos do nosso filho
Que teve nascer errante

Foste esculpido a preceito
Nas entranhas de outro ser
Não vais sorver do meu peito
Este meu longo querer

E nestas voltas da vida
Cuidou-te Deus sem saber
Para que não herdes no sangue
Este meu estéril sofrer

Não vais nascer de mim
De outro ventre virás
Mas filho da minha alma
Tão amado serás!

E nesta triste incerteza
Me pergunto em desalento
Já nascente de alguém?
Ou é Deus que te traz?

(Ala dos Reis)

Lindo poema!
Aproveitem a gestação para amadurecer ao máximo.

Por Cintia Liana

domingo, 4 de julho de 2010

Astrid Adota Criança

Foto: Revista Quem

A apresentadora disse não querer divulgar fotos do bebê ainda, mas postou em seu blog a mãozinha do menino.

Astrid Fontenelle
21/10/2008 12:04
 
A jornalista Astrid Fontenelle anunciou, em seu blog, na terça-feira (14), que adotou um bebê – de 2 meses, com 58 centímetros e 5,7 quilos – com seu atual namorado, o produtor da banda Chiclete com Banana, Fausto Franco. Com o título “O amor incondicional chegou”, ela diz que a adoção foi a realização de um grande sonho. “Gabriel é meu filho, querido, desejado, sonhado e amado. Agora, sim, eu tenho uma família para sempre.
Incondicionalmente eu vou amar”, escreveu. “Choro o tempo todo, mas choro de alegria.” Astrid também disse que pretende fazer um blog dando dicas de como cuidar de um bebê. Por enquanto, não vai publicar muitas fotos da criança em seu blog. “Vou regular um pouco (as fotos) e repetir o que disse meses atrás, quando me separei: essa é a minha história e o que eu posso contar para vocês. Mas é a minha intimidade.”

Astrid Fontenelle
 

Por Cintia Liana

sábado, 3 de julho de 2010

Como vai a família?

Foto: facebook

"Sou P., casado com B. e pai de G. que veio ao nosso encontro perto de completar 2 anos e hoje tem 4.

Entre a entrada dos documentos e chegada do meu filho foram 9 meses. Neste intervalo de tempo buscamos nos preparar, lendo muito, buscando preparar todos para a chegada dele e, se considero hoje a nossa história feliz, certamente foi por termos conhecido pessoas maravilhosas que não somente nos passaram a experiência que já tinham, como dividiram as dúvidas e dificuldades conosco.

Estou falando para que os que estão ainda somente habilitados. Curtam a paisagem que isso vai ser fundamental na chegada.

O periodo de adaptação dele, logo no inicio, foi difícil, mas estávamos preparados e amparados pelos amigos e em pouco mais de 1 mês, meu filho estava totalmente "em casa".

Hoje, após quase dois anos, parece que ele sempre esteve conosco e o amor entre nós todos é reciproco e contagiante."

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Quem assina é um pai muito feliz e realizado, um grande amigo meu. Com B. forma um lindo e jovem casal que conheci em 2008.

Por Cintia Liana