Mandy Lynne
"Não existem crianças hiperativas. Sua televisão é que tem poucos canais infantis". A foto do outdoor que exibe essa mensagem traz dois meninos em ação, em um ambiente fechado, sala ou quarto onde as crianças urbanas passam a maior parte de seus dias. Um deles levanta uma bola de futebol sobre a cabeça, como se estivesse pronto para arremesá-la em nossa direção. O outro, igualmente animado, acion...a um controle remoto. A TV está para ser ligada, os pais podem respirar aliviados: paz no lar.
(...)
O jargão psiquiátrico (hiperativo) designa uma patologia, suposto distúrbio do comportamento infantil que exige tratamento farmacológico (...) As causas da angústia da criança diagnosticada como hiperativa, os conflitos latentes no grupo social e familiar onde ela se insere, os imperativos do gozo que produzem nela, permanentemente, uma excitação aflita e sem objeto, nada disso entra em questão quando um diagnóstico fisicalista é aplicado ao sofrimento infantil. Os desadaptados ao mundo atual sofrem de hiperatividade ou de déficit de atenção, assim como sofrerão na adolescência de sociofobia, de pânico ou de depressão.
A indústria farmacêutica encarrega-se, assim, dos "restos" pulsionais que a indústria do espetáculo não foi capaz de adaptar às suas ofertas. Aos pais aflitos restam duas alternativas para tranquilizar seus rebentos angustiados, agressivos, rebeldes, ansiosos - ou simplesmente mal-educados: os psicofármacos e a televisão. A ironia da publicidade, hoje, favorece mais a produção conformista do cinismo do que a desconstrução crítica das verdades socialmente compartilhadas. A ironia publicitária é a reafirmação esperta da ideologia.
Telespectadores hiperativos - Maria Rita Kehl
Livro: 18 Crônicas e Mais Algumas, Boitempo Editorial
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O jargão psiquiátrico (hiperativo) designa uma patologia, suposto distúrbio do comportamento infantil que exige tratamento farmacológico (...) As causas da angústia da criança diagnosticada como hiperativa, os conflitos latentes no grupo social e familiar onde ela se insere, os imperativos do gozo que produzem nela, permanentemente, uma excitação aflita e sem objeto, nada disso entra em questão quando um diagnóstico fisicalista é aplicado ao sofrimento infantil. Os desadaptados ao mundo atual sofrem de hiperatividade ou de déficit de atenção, assim como sofrerão na adolescência de sociofobia, de pânico ou de depressão.
A indústria farmacêutica encarrega-se, assim, dos "restos" pulsionais que a indústria do espetáculo não foi capaz de adaptar às suas ofertas. Aos pais aflitos restam duas alternativas para tranquilizar seus rebentos angustiados, agressivos, rebeldes, ansiosos - ou simplesmente mal-educados: os psicofármacos e a televisão. A ironia da publicidade, hoje, favorece mais a produção conformista do cinismo do que a desconstrução crítica das verdades socialmente compartilhadas. A ironia publicitária é a reafirmação esperta da ideologia.
Telespectadores hiperativos - Maria Rita Kehl
Livro: 18 Crônicas e Mais Algumas, Boitempo Editorial
Postado Por Cintia Liana
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