Esse foi um texto meu, publicado no dia 09 de janeiro de 2013 no site Indika Bem.
Google Imagens
Por Cintia Liana Reis de Silva
A vida moderna exige muitas vezes que nos adequemos aos novos hábitos e culturas, muitas vezes até importadas de outros Países, movidas pelo comércio desenfreado, sem ter a devida noção crítica, sobretudo quando se trata de nos proporcionar mais conforto e praticidade. Entendemos que na vida corrida de hoje a praticidade é um elemento fundamental, mas devemos estar atentos para que essas novas práticas não afetem direta e indiretamente a forma sadia no contato e na educação dos filhos, que estão em pleno desenvolvimento.
Um bom exemplo para a reflexão que proponho neste texto é o uso excessivo do carrinho de passeio para o bebê e para as crianças nos primeiros anos de vida.
Hoje vemos muitos bebês ficarem por horas no carrinho, porque se criou a crença de que filho no colo se torna mal educado e dependente. Ocorre que tudo deve ter um equilíbrio, até para não criarmos uma cultura inversa, onde o filho no colo seja visto como algo negativo. Na verdade, com esse pensamento extremista, o privamos de uma atmosfera afetiva ideal para a construção sã do seu “eu”, quando negamos um contato benéfico com os pais e essa interação fica comprometida, assim, por exemplo, não se pode exercitar o contato com os olhos, que o filho sinta o calor do corpo da mãe, entre em contato com a sua respiração, o ritmo da caminhada do pai, a força e a segurança nos braços dos progenitores quando são carregados e “sustentados”, tudo isso com a emoção implícita de exercitar a maternagem e a paternagem. Essas sensações, que só o contato físico direto pode proporcionar, não têm preço e é de uma riqueza simbólica ímpar no desenvolvimento pleno da criança, para os reflexos positivos em seu futuro, quando ela sente a emoção na brincadeira, no abraço, sente o calor no contato com a pele da mãe e bem de perto constata o real sorriso de ternura em seus olhos, criando o que nós especialistas em família chamamos de “apego seguro”, o que vai poder gerar uma vida adulta emocional equilibrada e segura com muito mais facilidade.
Crianças de 3, 4 e 5 anos também são empurradas no carrinho como se fossem portadoras de limitação física, podendo instituir a preguiça e os pais não se dão conta de que estas precisam caminhar, adquirir autonomia e não somente serem controladas por estarem “presas” no carrinho. Claro que às vezes pode ser bastante necessário o uso deste acessório, mas usá-lo sempre pode ser um perigo, porque o corpo da criança está em desenvolvimento, seus músculos precisam ser exercitados, fortalecidos, elas precisam gastar energia e sentir que caminhar “ao lado” dos pais pode ser bem melhor e mais educativo que “serem empurradas” por eles.
Deixar o bebê chorando por horas dentro do carrinho, por exemplo, pode acarretar uma significativa privação materna e sensorial, um “deficit de acudimento”, a ponto de desencadear patologias psicológicas, psicossomáticas e no desenvolvimento afetivo, como o autismo, por exemplo. Ser ignorado quando se chora continuamente é uma espécie de abuso contínuo e isso interfere na relação futura que a criança terá com as figuras de apego.
Somos seres movidos por sentimentos, mais ainda nos primeiros anos de vida. Os adultos não podem esquecer que quando um bebê pede por acolhimento físico se trata de uma necessidade real afetiva e não apenas de dependência ou “dengo”, inclusive porque ainda provam a fusão emocional existente entre o seu frágil corpo e o corpo da mãe, ele ainda não desenvolveu autonomia em seu sentimento de existir, seu instinto diz que ele existe através do corpo dela. Ele sente tudo o que ela sente, mesmo que inconscientemente. O seu pequeno corpo reflete suas emoções. Não podemos ignorar uma necessidade tão essencial e confundí-la com birra, devemos desenvolver empatia.
Os bebês demonstram o que precisam e ficar chorando no carrinho ou no berço só lhes mostrará uma coisa que aprenderão para a vida: que não adianta pedir, não adianta chorar, sua voz não tem força, que ele não pode confiar em ninguém, pois nem as pessoas que deveriam amá-lo dão atenção suficiente a um pedido seu, ao seu desejo de ser abraçado e acolhido naquele momento, de estar perto fisicamente de seus pais. Não ser acudido lhes mostra que suas necessidades podem não ser importantes, pois não são respeitadas e nem validadas no seio de sua própria família.
Não podemos achar que, só porque se trata de um bebê, ele não deve ser respeitado em suas vontades. As crianças não devem ser somente um depósito de “educação”, treinamento e fazer o que os pais querem, elas também expressam vontades, demandas importantes, que normalmente não são entendidas pelos adultos, que na maioria das vezes já se esqueceram o que significa ser criança e como eles sentem o mundo.
Cintia Liana Reis de Silva é psicóloga e psicoterapeuta, especialista em psicologia conjugal, familiar e adoção.
Nenhum comentário:
Postar um comentário