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Luis Nassif
Jornal GGN - Grupos de apoio de adoção de crianças têm se preocupado com decisões da Justiça que têm devolvido crianças em processo de adoção aos pais biológicos. De acordo com a Associação Nacioal dos Grupos de Adoção (Angaad), existem casos polêmicos em Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro. Dois dos casos envolvem uma menina de 4 anos na cidade de Contagem (MG) e um menino de 1 ano na cidade de Serra (ES).
Para Suzana Schettini, presidente da associação, existe uma supervalorização da família biológica, com decisões judiciais que não levam em conta o interesse da criança. "São verdadeiras tragédias familiares nas quais os pais adotivos são vilipendiados, desrespeitados, desqualificados e a criança é massacrada, em um verdadeiro estupro psicológico", diz. Ela também critica a demora em se conceder a guarda definitiva das crianças. Leia mais abaixo:
Do G1
Casos na Justiça provocam embates e causam receio em pretendentes.Levantamento feito a pedido do G1 mostra polêmicas em MG, ES e RJ.
Decisões da Justiça que têm devolvido aos pais biológicos crianças em processo de adoção têm causado apreensão nos grupos de apoio e em pretendentes pelo país. Levantamento feito pela Associação Nacional dos Grupos de Adoção (Angaad) a pedido doG1 mostra que há casos polêmicos em Minas Gerais, no Espírito Santo e no Rio de Janeiro.
Entre eles estão o caso de uma menina de 4 anos de Contagem (MG) e o de um menino de 1 ano de Serra (ES). No primeiro, a Justiça obrigou no fim do ano passado que a criança fosse devolvida aos pais biológicos, mas um mandado de segurança paralisou a reinserção. Uma decisão sobre o caso deve sair nos próximos dias. No segundo, a família adotiva conseguiu apenas neste mês reaver a guarda do garoto, que também havia sido levado, aos 8 meses de idade, após uma ordem da Justiça.
Para a presidente da Angaad, Suzana Schettini, o que tem ocorrido é uma supervalorização da família biológica, com decisões que não levam em conta o interesse da criança. “O que a gente tem vivenciado são verdadeiras tragédias familiares nas quais os pais adotivos são vilipendiados, desrespeitados, desqualificados e a criança é massacrada, em um verdadeiro estupro psicológico”, afirma.
A juíza Vera Lúcia Deboni, coordenadora da Secretaria da Infância e da Juventude da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), no entanto, diz que é preciso cautela ao analisar aos processos. Isso porque, na maioria dos casos, as decisões foram tomadas após uma adoção consensual ou com a destituição do poder pátrio ainda em curso. "A família biológica tem o direito de buscar a permanência da criança em seu contexto e, para isso, é preciso garantir todos os prazos para se defender das acusações feitas contra ela", afirma.
No caso de Contagem, por exemplo, a família perdeu a guarda acusada de maus-tratos, mas, alegando ter se recuperado, pediu a criança de volta.
Já no caso de Paracambi (RJ), a mãe biológica consentiu com a adoção logo no nascimento, mas a criança acabou retirada da família adotiva após mais de um ano e meio. Na decisão, o juiz ponderou que, devido à idade, “a adaptação ao verdadeiro lar” se dará de forma tranquila e que “essa é a natureza das coisas: aquele que gerou que cuide e conviva com seu filho”.
No Rio, um outro drama similar: após dois anos de convivência com a família adotiva, a menina foi devolvida para a mãe biológica, que se arrependeu de dar a filha à adoção e pediu na Justiça seu retorno, segundo a Angaad.
"Alguns magistrados, na melhor das intenções, colocam as crianças em famílias substitutas antes da decisão definitiva da destituição do poder familiar. E isso pode acabar revertendo mesmo", afirma Vera Lúcia Deboni.
Suzana, da Angaad, critica, no entanto, a demora em se conceder a guarda definitiva das crianças. “Muitas comarcas, que não têm equipes técnicas adequadas, não priorizam os processos de adoção, estendendo muito o tempo da guarda provisória, o que também abre espaço para esses tipos de situação”, diz.
Para o presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Rodrigo Pereira, a demora afeta toda a política nacional de adoção. “É uma burocratização. É claro que a adoção tem que estar cercada de segurança. Mas se há pessoas mal intencionadas, elas formam 1% do total. E aí as outras 99% acabam pagando por elas. A guarda provisória durar mais de um ano é algo absurdo, que gera insegurança e instabilidade jurídica.”
Família biológica x família adotiva
Pereira diz que já fez reuniões com o Ministério da Justiça para tentar alterar a legislação, que diz que a manutenção ou reintegração da criança e do adolescente em sua família biológica terá preferência em relação a qualquer outra providência. “A família não é um elemento da natureza. Os laços de sangue não são suficientes para garantir uma relação familiar. Muitas dessas decisões [de devolução] estão travestidas de preconceito”, afirma.
Para a juíza Vera Deboni, entretanto, há uma regra constitucional que delimita a primazia da família biológica. "O que não pode ser feito como processo civilizatório é dizer que pobre não pode ter filho. Se a família não tem condições, é preciso criar a partir das retaguardas e das estruturas sociais necessárias as condições para que ela possa manter a criança. A pobreza jamais poderá ser o motivo da perda do poder familiar. E hoje, por conta da ansiedade de muitos adultos que pretendem a adoção, que desejam uma criança recém-nascida, muitas vezes isso acontece."
Atualmente há 5,4 mil crianças aptas à adoção no Cadastro Nacional. São mais de 30 mil pretendentes cadastrados. Mas um abismo ainda os separam. Parte dos especialistas diz que a repercussão dos casos de devolução noticiados tem feito muitos desistirem do ato. “Há pretendentes receosos e outros que estão no processo de adoção e têm ouvido do filho: ‘pai, o juiz vai me tirar aqui de casa também?’”, afirma Suzana.
Sobre os embates no país, a juíza Vera Deboni diz que a solução precisa ser pensada caso a caso. "Se, de um lado, a criança tiver um vínculo afetivo efetivamente criado com a família substituta e, do outro, houver a família biológica retomando a convivência, há equipes técnicas que trabalham com mediação familiar que podem contribuir na busca de alternativas, não só de guarda compartilhada, que divide deveres e direitos, mas no compartilhamento da convivência, de períodos de visita. A criatividade jurídica pode ser utilizada."
Procurado, o Conselho Nacional de Justiça diz que não se posiciona sobre os casos por se tratar de "entendimentos jurisdicionais".
Fonte: http://jornalggn.com.br/noticia/apos-estimular-retomada-de-crianca-adotada-globo-analisa-o-mal-que-causou