"Uma criança é como o cristal e como a cera. Qualquer choque, por mais brando, a abala e comove, e a faz vibrar de molécula em molécula, de átomo em átomo; e qualquer impressão, boa ou má, nela se grava de modo profundo e indelével." (Olavo Bilac)

"Un bambino è come il cristallo e come la cera. Qualsiasi shock, per quanto morbido sia
lo scuote e lo smuove, vibra di molecola in molecola, di atomo in atomo, e qualsiasi impressione,
buona o cattiva, si registra in lui in modo profondo e indelebile." (Olavo Bilac, giornalista e poeta brasiliano)

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Entrevista sobre Adoção Homoafetiva

Entrevista com a psicóloga Cintia Liana
Cedida a alunos do curso de Jornalismo da Faculdade UNIVERSO em setembro de 2007

Foto: A Psicóloga Cintia Liana Reis em entrevista

Qual é a importância dos pais por perto? É necessário que os pais sejam de sexo diferentes?

É essencial a presença de um ser responsável que dê amor a uma criança.
Sobre ser necessário os pais serem de sexo oposto, acredito que absolutamente não! Quem impõe isso é a cultura, criada e escrita por uma elite dominante. A criança abrigada quer ter pai e/ou mãe, se sentir amada, respeitada e protegida, não importa o sexo, a cor, a idade, a nacionalidade e a orientação sexual.
É claro que uma família nuclear é mais aceita pela sociedade e assim é um pouco mais fácil da criança entender essa família e seu impacto social, mas isso é um modelo, e os outros modelos? Têm que sofrer por serem diferentes do convencional?
Temos que colocar os pés no chão e aceitar a realidade. Que existem pessoas diferentes, com escolhas diferentes e que podemos fechar os olhos para as pessoas que têm o direito de serem como quiserem. Por que isso dói? Por que choca? Por que é difícil de entender? Temos que entender, a evolução do mundo está aí para quem quiser acompanhar. Por que tanta dificuldade em aceitar o novo ou entender como necessário e não prejudicial?
Imagine a criança que nunca teve ninguém para protegê-la ou chamar de pai e/ou mãe. Se tiver isso agora, para quem nunca teve nada, o que mais importa?

A falta de referência de um pai ou de uma mãe faz falta? Afeta alguma coisa no psicológico da criança ter dois pais ou duas mães?

Sim, todos nós desejamos pai e mãe e com eles aprendemos a nos comportar, são nossos modelos. Na falta desses pais elegemos outras pessoas. Às vezes, mesmo tendo um pai e uma mãe, pode-se acabar elegendo os tios como pontos de referência, pois esses podem nos parecer mais agradáveis.
No caso de pares homoafetivos, eles também “imitam” as relações heterossexuais, um é mais masculino e outro é mais feminino, paternal e maternal, mas fora do núcleo mais íntimo a criança pode eleger a parte que te falta, um tio ou uma tia para ser sua referência de masculino ou feminino.
Ter dois pais ou duas mães não precisa ser negativo, tudo pode ser conversado. Para a criança acaba sendo natural e isso não faz dela problemática.
Sabemos que muitas avós fazem juntamente com a mãe tal papel e até competem pelo amor da criança e pela autoridade perante ela, isso e mais aceitável porquê? Isso é complicado e totalmente negativo para o crescimento da criança e para a sua educação. Mãe é mãe, avó é avó, se fossem a mesma coisa não chamaríamos por nomes deferentes.

Como é feita a preparação de crianças e famílias adotivas? E para ser adotada por homossexuais, como é feita essa preparação?

Normalmente, a criança está preparada para a adoção, é isso o que quer quando não tem vínculos positivos com a família de origem. Mas ela precisa ser avisada que será adotada e ajudada a dar conta de sua ansiedade e medos.
A criança quer adotada, ela não pergunta por quem, qual o sexo, que cor de pele tem, idade, nacionalidade. Essas informações são detalhes para ela.
Quanto a família, precisa ser avaliada é convidada a entrar no verdadeiro mundo da adoção, da maternidade e paternidade, desconstruindo os mitos, fantasias e preconceitos. Desconstruindo também a criança idealizada e construindo a criança possível, que pode ser bem melhor.
A criança real acaba sendo a melhor para quem se libera de suas exigências construídas ao longo do tempo, desde a época em que brincava de bonecas.
Existe o período de visitas e o de convivência antes de ser dada a sentença final.

Há algum estudo científico que comprove que a adoção por homossexuais não interfere na escolha da sexualidade da criança?

Que eu conheça não, mas vemos naturalmente que homossexuais sempre são filhos de heterossexuais. Façamos uma retrospectiva das pessoas que conhecemos e chegaremos a esse resultado.
No mais, hoje há muita literatura sobre o assunto, de muitos bons escritores da área do direito e da psicologia.

Quais são as conseqüências de crianças adotadas por homoafetivos?

Como em qualquer família, a criança é também fruto dos referenciais familiares, mas isso não implica a escolha sexual. O que pode acontecer é a criança enxergar a escolha sexual das pessoas de uma forma mais tolerante ou o contrário, mas isso não é uma regra.

Como contar, ou mostrar a uma criança que ela não tem uma mãe e um pai, mas sim, dois pais ou duas mães?

Ela crescerá vendo a realidade. Aos poucos isso deverá ser conversado no lar. Ela verá que isso não é um tabu para a família e em algum momento poderá fazer perguntas. A criança absorve muitas informações também através de “historinhas”.

Qual é o número de homossexuais (casais) que se candidatam à adoção?

Não tenho um número fechado mas, pessoas solteiras homossexuais que adotaram em quase três anos que participo de adoções em Salvador, foram umas 30 (trinta) mais ou menos. Mesmo tendo parceiros elas ainda buscam a adoção sozinhas.
Algumas pessoas solteiras heterossexuais também ainda acham que só pessoas casadas heterossexuais podem adotar.

Você é a favor de lei que regulamente a adoção por casais homoafetivos? Por quê?

Falando por mim e não por nenhuma instituição, eu sou a favor, pois percebo que a identidade sexual não faz da pessoa ser humano melhor ou pior que ninguém. Isso não compromete sua índole, seu caráter, não faz dela pessoa diferente de ninguém. Assim como a formação da identidade e escolha sexual da crianças não vai depender exclusivamente da orientação sexual dos pais e sim da maneira em que vivem essa sexualidade, sejam esses pais hetero ou homossexuais.

Você acha que esse tipo de adoção seria um problema a mais para a criança?

Não. Como já disse, a sociedade, mesmo que lentamente, terá que evoluir. Se não começarmos a mudar, a sociedade nunca irá mudar, é um erro não viver algo com medo dos preconceitos sociais. Os pais só precisam estar muito atentos para fortalecer a criança. As pessoas não estão erradas em tentarem ser felizes, o que é errado é o preconceito.

Os homossexuais têm capacidade de constituir uma família e têm plenas condições de criar, educar, proteger e amar uma criança. Por qual motivo essa adoção ainda não é aceita?

Claro que têm! A homossexualidade não é uma patologia! A legislação ainda está pautada em alguns preconceitos trazidos ao longo dos séculos, em uma mentalidade ultrapassada, em crenças antigas, mas isso vai ter que ser revisado. Tem que ser, afinal temos que evoluir e a lei também!

Há algum problema em crianças presenciarem cenas de afeto dos pais?

Não, para ela isso será natural, assim como com pais heterossexuais. É claro que existe um limite para a expressão afetivo sexual na frente da criança, como em qualquer família.

Por Cintia Liana

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