"Uma criança é como o cristal e como a cera. Qualquer choque, por mais brando, a abala e comove, e a faz vibrar de molécula em molécula, de átomo em átomo; e qualquer impressão, boa ou má, nela se grava de modo profundo e indelével." (Olavo Bilac)

"Un bambino è come il cristallo e come la cera. Qualsiasi shock, per quanto morbido sia
lo scuote e lo smuove, vibra di molecola in molecola, di atomo in atomo, e qualsiasi impressione,
buona o cattiva, si registra in lui in modo profondo e indelebile." (Olavo Bilac, giornalista e poeta brasiliano)

sábado, 9 de julho de 2011

Estatuto da criança chega aos 21 anos sem mobilização

Mandy Lynne

07 de Julho de 2011

A maioridade do Estatuto da Criança e do Adolescente, que completa 21 anos na próxima quarta-feira, 13, deve ser comemorada pelos avanços que representou, mas ainda há muita a ser concretizado. "O ECA foi um divisor de águas no sistema jurídico, antes existia o Código de Menores, que tratava a criança como um objeto", relata o juiz da Primeira Vara da Infância, José Dantas de Paiva, lembrando, no entanto, que muitas das ações ainda executadas remetem ao antigo código.

Divulgação
Com o Estatuto da Criança e do Adolescente - que completa 21 anos - garante direitos aos jovens brasileiros
De linhagem humanista, José Paiva atua e acompanha a implementação do ECA há décadas, e lamenta o fato da desmobilização que está ocorrendo no chamado Sistema de Garantia de Direitos. "Há uma inércia que vem desde o Conselho Nacional dos Direitos da Criança - Conanda até os conselhos estaduais e municipais que tratam das questões relativas a este universo", crítica, lembrando que recentemente lançou uma portaria tratando do acolhimento institucional de crianças, na qual ressalta a ausência de uma Política Estadual e Municipal de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e de Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária, que devem ser elaboradas pelos Conselhos de Direitos estadual e municipais.

"Em outros momentos, havia uma mobilização maior", opina, acrescentando que muitos dos atores que participavam deste movimento junto a organizações não governamentais, hoje constam nos quadros do governo, a começar por Brasília. Com isso, o movimento foi perdendo força. "O ECA é uma lei quase perfeita, tivemos vários avanços, mas precisamos redimensionar o trabalho das ong´s e das organizações governamentais que trabalham nesta área", enfatizou.

Como pontos positivos, o Juiz lembra que hoje o adolescente que cometeu ato infracional pode acompanhar todas as etapas do seu processo, o que antes não ocorria. "Hoje eles conhecem mais os seus direitos", afirma, citando como exemplo a criação dos conselhos de direitos e tutelares, de delegacias e promotorias especializadas e tantos outros organismos de controle social, promoção e defesa dos direitos humanos das crianças e adolescentes. Ele cita a questão da adoção de crianças como simbólica. "Com o cadastro nacional, tornou-se muito mais fácil às crianças serem adotadas", disse.

A implementação do Sistema Nacional de Atendimento Sócio-Educativo e do Plano Nacional de Convivência Comunitária, entre outros, possibilitou novos olhares e metodologias para o trabalho de abrigamento. No entanto, enquanto a legislação avançou, a "retaguarda", como é denominada as organizações que executam as ações de atendimento, parece ter parado no tempo. "É preciso dar uma carga de animo nestas instituições, para que o trabalho avance", defende.

"Quem mais desrespeita são as autoridades"
Um dos resultados positivos obtidos a partir da implementação do ECA foi a implantação da Frente Parlamentar em Defesa da Criança e do Adolescente, fórum qualificado que existe desde 2006, com a participação de mais de 120 entidades não-governamentais e governamentais, que abre espaço para discussão de temas significativos na área da infância, buscando estimular a definição de políticas publicas eficazes e eficientes, que estejam em sintonia com o desejo da sociedade. Em 2011 a Frente passou a ser coordenada pela vereadora Júlia Arruda.

A partir de reuniões com diversos representantes de segmentos que atuam na proteção e defesa da criança e do adolescente, além do controle social das políticas públicas, a Frente elaborou um plano de ação para os próximos dois anos, com uma agenda permanente de debates e maior interatividade com as comunidades, através de reuniões itinerantes.

Júlia observa que está traçando objetivos com coerência, respeitando o que foi feito, programado e está em andamento. "Entendemos que boa vontade, boas ideias e garra são importantes, mas não são suficientes. Por isso, acreditamos que é preciso consenso, diálogo, decisão em conjunto, participação", observa.

"Por acompanhar de perto tudo o que vem sendo feito, especialmente nos últimos dois anos, entendemos que muito avançamos, mas muito mais temos a contribuir para que tenhamos políticas públicas direcionadas, claras e práticas. Hoje quem mais desrespeita o ECA são as autoridades e estamos cobrando dos nossos gestores a devida atuação que nossas crianças precisam. Se de fato o ECA fosse cumprido, muitas falhas não estariam persistindo. É momento de comemorar, mas também de avaliar os erros", diz a vereadora.

Defesas
A Frente defende o direito à convivência familiar e comunitária, com o intuito de prevenir o abandono e não permitir que meninas e meninos fiquem esquecidos em abrigos. Também realiza forte trabalho contra a exploração sexual e pedofilia, com a aprovação de uma lei que estabelece a campanha permanente em transportes públicos sobre a temática, com a divulgação do disque denúncia (100).

A vereadora atua também no planejamento para uso dos recursos na educação e solicitou, por exemplo, que a Secretaria Municipal de Trabalho e Assistência Social (Semtas) desenvolva um Plano de Ação para regular o uso dos recursos do Fundo Municipal de Assistência Social no programa Creche Manutenção.

Atendimento socioeducativo é grande desafio
De acordo com o Levantamento Nacional do Atendimento Socioeducativo ao Adolescente em Conflito com a Lei, existem hoje no Brasil 12.041 adolescentes cumprindo medida de internação (o que representa um crescimento de 4,50%), seguidos de 3.934 em internação provisória e 1.728 em cumprimento de semiliberdade. A pesquisa, coordenada pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR), mostra que em 2010 houve uma quebra da tendência de queda no número de internações que vinha ocorrendo desde 2007. É absoluta a prevalência de adolescentes do sexo masculino em situação de cumprimento de medida socioeducativa de internação e em situação de internação provisória. O índice é de 94,94%%.

A Constituição Federal determina que as crianças e os adolescentes recebam tratamento prioritário por parte do Estado e da sociedade em geral. As determinações entre os artigos 112 e 130 do ECA), em vigor desde 1990, reafirmam a necessidade de oferecer atenção diferenciada a essa parcela da população quando envolvidas em atos infracionais.

Apesar dos avanços registrados nas últimas décadas, o Brasil ainda convive com graves violações de direitos nas unidades de internação socioeducativa. É fundamental avançar na definição de uma política de atendimento que garanta estruturas, procedimentos e recursos humanos e orçamentários adequados em todas as fases do processo, desde a prevenção, a captura, o julgamento e a ressocialização.

Levantamentos do Conselho Nacional de Justiça apontam ocorrência de graves violações de direitos nas unidades de atendimento, como ameaça à integridade física, violência psicológica, maus-tratos e tortura, além de negligência relacionada ao estado de saúde dos adolescentes.. Há ainda denúncias de jovens privados de liberdade em locais inadequados, como delegacias, presídios e cadeias.

A rede física atual, segundo o levantamento da SDH/PR, está composta por 435 unidades, sendo 305 para atendimento exclusivo de programas. A situação de precariedade é seria em muitas instalações, sendo mais evidente na região Nordeste onde a maioria dos estados apresentam superlotação com taxas acima da capacidade.

Propostas do SINASE
Com o objetivo de dar uma nova perspectiva ao cumprimento das medidas socioeducativas no Brasil, está em tramitação no Congresso Nacional o Projeto de Lei 1.627/07, que institui o Sinase. A iniciativa, que tem como relator o senador Eduardo Suplicy, busca estabelecer um marco regulatório no País, organizando os princípios de natureza política, administrativa e pedagógica para o adequado funcionamento dos programas socioeducativos de atendimento ao adolescente em conflito com a lei.

Um dos principais focos da proposta é assegurar a co-responsabilidade da família, da comunidade e do Estado, articulando os três níveis de governo. Além disso, o Sistema busca estabelecer parâmetros nacionais que priorizem a execução de medidas em meio aberto em detrimento das restritivas de liberdade, a serem usadas em caráter de excepcionalidade.



Postado Por Cintia Liana

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