"Uma criança é como o cristal e como a cera. Qualquer choque, por mais brando, a abala e comove, e a faz vibrar de molécula em molécula, de átomo em átomo; e qualquer impressão, boa ou má, nela se grava de modo profundo e indelével." (Olavo Bilac)

"Un bambino è come il cristallo e come la cera. Qualsiasi shock, per quanto morbido sia
lo scuote e lo smuove, vibra di molecola in molecola, di atomo in atomo, e qualsiasi impressione,
buona o cattiva, si registra in lui in modo profondo e indelebile." (Olavo Bilac, giornalista e poeta brasiliano)

domingo, 19 de setembro de 2010

História 6

Foto: Google Imagens

Revista Veja São Paulo

"Eu quero o anjinho para me proteger." – Angélica

A frase sai direta, misturando alegria com inquietação, naquele jeito ingênuo de criança. "Minha vó quer me levar", diz Angélica Ramos, 9 anos. Logo depois, seus olhos refletem a incerteza. Como seria passar a morar com dois irmãos menores, na casa da avó que mal conhece?

Angeliquinha, como gosta de ser chamada, está na Casa Vida desde os 3 anos. No confortável sobrado construído especialmente para abrigar catorze meninos e meninas portadores do HIV, ela se sente realmente em casa. Escolhe o CD, canta, dança, elogia as duplas sertanejas, sorri encabulada ao falar do grupo musical Hanson. Mostra, nos seis quartos, quem dorme em cada uma das camas — cuidadosamente arrumadas, com brinquedos sobre o travesseiro. Abre as portas e explica o funcionamento desse lar. "Aqui é a sala de estudos, aqui a farmácia, aqui o escritório..." Na lavanderia, fica emburrada ao ver que o tênis não estará seco até a hora da escola. Logo renova a pose, enquanto desfila pelo corredor com o uniforme do colégio. Chama de pai o padre Julio Lancellotti, que criou a instituição em 1991 e ainda hoje comanda o trabalho nas duas casas (na outra ficam vinte crianças de até 6 anos). A coordenadora Rosana Soares Ribeiro ela chama de mãe. Namora o Anjo do Gugu, boneco que permanece na caixa até que um adulto tome a difícil decisão de escolher quem será contemplado com o cobiçado presente.

Agora, Angélica terá uma primeira oportunidade de se acostumar com a avó. Na noite de Natal estará com ela e os dois irmãos que vivem em outra instituição. "Natal? É a festa do menino Jesus, o aniversário dele", diz. "Tem também o Papai Noel, que traz uns presentes. A gente não pode pedir porque é falta de educação, mas pode querer. Eu quero o anjinho para me proteger."

Publicação - Revista Veja São Paulo
Circulação - São Paulo – SP
Data - 23/12/98
Edição – 1578
Assunto - Abandono – Institucionalização
Título - Sete Histórias de Natal de Meninos e Meninas Carentes
Autora - Mirian Scavone


Postado Por Cintia Liana

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