Foto: Cintia Liana com Isabela, sua estagiária de Psicologia, e Priscila, secretária, em 2007.
Os interessados em adotar passam por avaliação psicológica com perito da vara da infância, que emite um parecer favorável ou desfavorável sobre a habilitação daquela pessoa ou casal e, para isso, se respalda em teorias científicas psicológicas. Esse parecer respaldará a sentença do Juiz, mas não é determinante.
Normalmente a avaliação é feita em forma de entrevista psicológica, onde o profissional saberá o número necessário de encontros que pode variar entre uma ou mais entrevistas, onde são verificados estrutura familiar dos requerentes, comportamento, pensamentos, crenças, inseguranças, medos, preconceitos, se as expectativas condizem com a realidade, perfil da criança desejada, os motivos do desejo deste perfil, o que pensam da paternidade, maternidade e educação e a motivação verdadeira (inconsciente) que leva o requerente a pleitear a adoção, que deve ser baseada em cima de um desejo legítimo de ter um filho, não por outro motivo, por companhia ou caridade, filho não deve ser visto como companhia, ele é quem precisa de companhia e cuidados, e caridade é algo pontual e um filho é para vida toda, é uma relação fortíssima, que irá se estabelecer e fortalecer durante toda a vida, assim como na parentalidade biológica, se houver a desejo.
O psicólogo pode utilizar técnicas de avaliação como um teste projetivo de personalidade para a análise mais aprofundada da psiquê dos requentes. Eu, além das entrevistas e do teste, realizava reuniões onde dava palestras, acolhia as dúvidas, respondia a todas perguntas e conversávamos sobre os sentimentos que surgem no processo de "gestação emocional", com a espera do filho adotivo.
Para adotar se deve ter mais de 18 anos, mais velho 16 anos que o adotado, que não sejam avós ou irmãos e que ame a criança verdadeiramente como filho. É essencial que seja uma pessoa saudável, que tenha uma vida responsável, que saiba assumir compromissos, principalmente com relação a futura paternidade, que deseje vivê-la e que isso seja legitimo e não para mostrar nada a ninguém, que possa dar uma vida digna a um filho.
Adotantes casais não são mais bem parados que adotantes solteiros, heterossexuais não são mais maduros que homossexuais, tudo vai depender da pessoa e não dessas condições.
Na época em que eu era perita e coordenadora do serviço de psicologia de uma Vara da Infância e Juventude eu realizava palestras e reuniões, que muitas vezes eram confundidas com "cursos". Esse nome não era muito bem vindo, pois antes o Judiciário não podia "preparar" e há alguns meses o curso de adotantes se tornou obrigatório e o Judiciário tem que oferecer.
Acho excelente esse espaço de acolhimento, reflexão, pois todos alí estão no mesmo barco, esperando, cheios de dúvidas, medos, expectativas, alegres, vibrando com essa “gravidez emocional” e todos acham maravilhoso compartilhar emoções e sentimentos. Isso valida e mostra que o que eles sentem é importante, que não estão sozinhos e traz uma sensação de respeito por esta espera tão importante que leva ao amadurecimento de diversas questões voltadas para a parentalidade, que é sempre reafirmada com a ida ao Judiciário. Se também existissem grupos de reflexão e preparação para a paternidade biológica o mundo estaria bem diferente.
Acho excelente esse espaço de acolhimento, reflexão, pois todos alí estão no mesmo barco, esperando, cheios de dúvidas, medos, expectativas, alegres, vibrando com essa “gravidez emocional” e todos acham maravilhoso compartilhar emoções e sentimentos. Isso valida e mostra que o que eles sentem é importante, que não estão sozinhos e traz uma sensação de respeito por esta espera tão importante que leva ao amadurecimento de diversas questões voltadas para a parentalidade, que é sempre reafirmada com a ida ao Judiciário. Se também existissem grupos de reflexão e preparação para a paternidade biológica o mundo estaria bem diferente.
Usar a adoção para outra coisa que não seja para a realização da paternidade é algo que o perito deve avaliar também e é algo muito sério. Usar a adoção para salvar o casamento, por exemplo, pode fazer o casal se separar ainda em processo de adoção, pois tudo vem a tona, a adoção é um processo de nascimento, renascimento da família, é um "parto". Os estudos mostram que tudo pode acontecer nestes casos mas, no geral, desaconselho totalmente qualquer uso da adoção que não seja para a realização legítima da parentalidade. Se não está preparado procure ajuda, faça terapia, melhore sua realidade e só depois procure se habilitar. A criança não espera pais perfeitos, isso não existe, mas espera alguém que possa dar-lhe uma boa base suportiva para a sua caminhada, principalmente no momento de sua chegada, na adaptação.
Ao mesmo tempo que devemos ser muito rigorosos com a avaliação, os estudos mostram que é preciso enxergarmos a capacidade de aprendizado, transformação das pessoas, de reconstrução de sua própria história, de construção do apego, do fascínio da capacidade de amar e não uma compreensão moralista e alienada em relação a consciência sócio histórica da família.
Como diz Lídia Weber (2008), devemos abandonar o pensamento tradicional e desenvolver um pensamento pós-moderno, pensamento este que entende que o ser humano tem capacidade de abarcar sistemas que são móveis e esse espaço é atemporal e ilimitado e demanda e permite um pensamento híbrido, abertura e transformação em todos os setores da vida. O pensamento conquistado na pós-modernidade é o pensamento “transdisciplinar, transparente, que lida com a possibilidade do ser-e-não-ser e com as infinitas cores do jogo de luzes de um caleidoscópio”. Fluidez paradgmática também é outra característica do pensamento pós-moderno, o que não mais permite a postura maniqueísta e parcial, pois existe uma gama de solicitações existenciais. É preciso ajustar o velho com o novo e adquirirmos equilíbrio nesse momento de revolução paradigmática. Quem está apto a selecionar “bons pais” em duas ou três entrevistas psicológicas?
Neste sentido, relembro da frase do construcionismo social que diz que “o olhar do observador deforma a realidade”, ou seja, todas as nossas observações, análises sentimentos e percepções frente ao objeto, a um acontecimento, a uma pessoa, é vista e sentida de acordo com a nossa bagagem, a nossa história anterior, essa forma está relacionada com o que aprendemos. Então não existe neutralidade absoluta e que o terapeuta, por exemplo, vê o paciente de uma forma peculiar que, por mais que exercite a neutralidade, a forma como ele vê é muito própria e está influenciada, contaminada por seu olhar carregado de sua história pessoal.
O bom psicólogo deve perceber que não é infalível, deve ver a sua participação no cenário e enxergar tudo isso, além de analisar essas tantas outras variáveis. O bom psicólogo também traz dúvidas ao processo, as dúvidas podem nos trazer outras riquezas no olhar e isso deve ser discutido com o Juiz, se necessário e possível, é claro.
Nós, analistas, observadores do comportamento nunca conseguiremos fazer uma análise igual entre nós, pois os analistas são pessoas diferentes. Diz o construcionismo que não somos "experts", nem engenheiros sociais, pois a realidade não é objetiva, nem representacional. Devemos ser arquitetos do diálogo, numa relação democrática, enxergando identidades não fixas e nos dando chances sempre de melhorar tudo e mostrando ao outro que também é capaz de construir novos significados.
Bateson desenvolveu uma concepção do processo interacional e suas indagações antropológicas e compartilha com outros teóricos a importância de introjetarmos o referencial da cibernética simples e da cibernética da cibernética na relação terapêutica. Principalmente no que diz respeito a segunda, que defende a ordem de recursão e reconhece o observador como parte integral do sistema observado, afastando qualquer premissa de “objetividade”, indo além dela e da subjetividade, como propõe a cibernética da cibernética. (BATESON apud REY, 2005).
Rey (2005) explica que Bateson defende que o melhor caminho seja a ética, pois para compreendermos os elementos fundamentais da epistemologia percebemos que ao “conhecer”, devemos observar que a visão do terapeuta fala também dele mesmo, a visão do observador participa do observado.
No que diz respeito a psicoterapia propriamente dita - e que não deixa de conter nela um grau de avaliação, e avaliação essa que é feita de forma direta nos setores de adoção - a concepção de uma epistemologia auto-referencial situa o terapeuta plenamente dentro da terapia e vai de encontro com o conceito de que a família atua como uma “caixa preta” e o terapeuta não atua neste sistema. Ele declara que qualquer mecanismo está circunscrito por ordens superiores de controle de retroalimentação, ou seja, a partir do momento que o terapeuta se insere no sistema, representa uma ordem superior. Nesta ordem superior de recursão, o terapeuta faz parte do sistema como totalidade e está sujeito às implicações e restrições de sua retroalimentação. Deste modo, é impossível exercer um controle unilateral, e pode ora facilitar, ora bloquear, a auto-correção indispensável.
Ao entendermos que o terapeuta está entrelaçado com o cliente, entendemos que a descrição do observador descreve mais ele mesmo do que o acontecimento. E nesta perspectiva, poderemos aprender continuamente em nosso trabalho clínico na relação com o cliente, tendo como base nossas próprias formulações e hipóteses, contribuindo para uma epistemologia do nosso próprio trabalho, da nossa própria atuação e de nós mesmos.
Edgard Morin (apud SANTOS, s/d) diz que “a ciência não é somente uma acumulação de verdades verdadeiras (...) é um campo sempre aberto onde se combatem não só as teorias, mas também os princípios da explicação, isto é, também as visões de mundo e os postulados metafísicos”.
Santos (s/d) também cita Paulo Freire que diz, “tenho pena e, às vezes, medo do cientista demasiado seguro da segurança, senhor da verdade e que não suspeita sequer da historicidade do próprio saber”.
O bom psicólogo que avalia candidatos a adoção, além de muita sensibilidade, deve ter muito estudo e humildade. Devemos proteger as crianças e respeitar os cidadãos.
Referência:
Encontra-se completa na barra direita de livros sobre adoção.
Por Cintia Liana
Livro da Psicóloga Cintia Liana sobre o percurso de construção da família através da adoção e seus aspectos psicológicos
Para comprar ou visualizar:
http://www.agbook.com.br/book/43553--Filhos_da_Esperanca
(2ª Edição - 2012)
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Por Cintia Liana
Livro da Psicóloga Cintia Liana sobre o percurso de construção da família através da adoção e seus aspectos psicológicos
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(2ª Edição - 2012)
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