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Dificuldades enfrentadas
Os preconceitos, a agressividade e a falta de limites, as dificuldades na escola e de aprendizagem, bem como os conflitos próprios da préadolescência foram destacados e dificultaram a convivência. A dificuldade de relacionamento, por sua vez, prejudicou também as relações na escola e a aprendizagem.
[...] colégio, complicado. Da segunda à quarta série eu fui chamado acho que umas cem vezes, lá no colégio (Risos). [...] Fazia gracinhas, perturbava, não fazia as tarefas, mas estou na marcação (Entrevista 4).
Sobre as relações entre adotante e adotado. Ferreira (2003, p. 50) afirma: “Todos os envolvidos direta ou indiretamente nessa chegada da criança passam a viver um processo de adaptação, de ajustamento a uma novíssima situação”. Diante disso, é possível compreender que se trata de um processo em que as relações vão se estreitando aos poucos e passando pelas fases, conforme elencadas por Elena Andrei (2001), que não do encantamento ao comprometimento amoroso.
A maior dificuldade foi nessa parte de educação e de ele ter um pouquinho de agressividade; ele não tinha respeito, se é mãe, se não é, ele queria bater em mim, e vinha para cima de mim. Tive que procurar psicólogo para me ajudar. Eu chorei muito, mas em nenhum momento eu pensei em devolver ou me arrependi (Entrevista 1).
Com relação ao comportamento agressivo, Weber (1998, p. 112) relata que “às vezes, essa criança pode ter tanto medo que em vez de mostrar amor, ela pode fazer tudo ao contrário, pois de maneira não consciente ela pensa: ‘eu vou ser abandonada novamente, então é melhor não gostar deles’”. Portanto, segundo a referida autora, é preciso que os pais adotivos estejam preparados para lidar com “estas reações, até mesmo certa hostilidade inicial, e serem tolerantes em relação a novos hábitos, costumes e sistemas de valores que a criança traz consigo” (Weber, 1998, p. 112).
Reação dos familiares
Nesse aspecto, foi possível perceber que, de maneira geral, os familiares receberam bem a notícia, com exceção de alguns que não concordaram no início, mas depois aceitaram e passaram a conviver bem com a criança. Recortes de falas destacam bem o que foi vivido pelas participantes:
[...] A família do meu esposo aceitou de uma forma mais rápida, né? A notícia foi mais bem aceita. Mas a dos meus pais não. Houve um pouco de resistência, que era uma menina grande, já pensavam nesses problemas: ‘Que vem cheia disso, vem cheia daquilo. Como é que você vai fazer?’. Toda uma resistência. Hoje não, hoje passou o tempo, já acabou essa história [...] (Entrevista 2).
Todo mundo ele chamava de tio, de tia. A mim também, até que foi se acostumando. A família já tem casos de adoção, então aceitaram numa boa (Entrevista 3).
Dias (2006) refere que o preconceito muitas vezes parte da própria família e que a aceitação e o apoio dos amigos e familiares é essencial para o sucesso da adoção. Sendo assim, é necessário que a família extensa seja preparada. A autora pontuou também que a aceitação se dá aos poucos e que a existência de outras adoções facilita a aceitação.
Sentimentos experimentados
Os entrevistados destacaram o sentimento de felicidade por terem se realizado como pai/ mãe, independentemente das características do filho e de alguma dificuldade de relacionamento. Salientaram ainda o sentimento de ser capaz de realizar algo.
Antes eu vivia aquela coisa egoísta, não tinha com quem dividir. Hoje eu me sinto mais capaz, responsável por outra pessoa. Apesar dos momentos difíceis que passamos, não tira a gratificação, a felicidade que eu tenho de estar com ele (Entrevista 1).
Eu me sinto normal, como mãe dele mesmo. Mas, às vezes, sinto-me cansada porque eu tenho que fazer tudo, não tenho empregada (Entrevista 3).
Apenas o entrevistado de número quatro disse que, apesar de estar cada vez mais se sentindo pai, às vezes se sente triste e desvalorizado por seu filho ainda não reconhecê-lo como pai, mas, mesmo assim, sente-se bem com ele. Vale salientar que esta adoção é recente e que ambos parecem estar ainda no processo de reconhecimento.
Hoje eu me sinto bem em estar com ele. Eu me preocupo com ele. Eu já me arrependi muito, mas hoje eu coloco ele em primeiro lugar (Entrevista 4).
Evolução dos filhos
Todos os entrevistados perceberam essa questão de forma bastante positiva. Eles disseram que várias transformações nos campos afetivo, cognitivo e social ocorreram na vida dos filhos depois da adoção.
Ele já evoluiu cem por cento [...] já está na quarta série, aprendeu a ler, já lê direitinho; na escola, apesar de não tirar notas boas, porque ele não estuda mesmo, ele evoluiu bastante na escola. Emocionalmente também. Ele já tem certeza que eu gosto dele, que ele não vai mais embora. Ele se sente mais seguro hoje. Ele já bota para fora os sentimentos dele, nós conversamos muito. Esse momento de agressividade diminuiu muito [...] Ele é muito amoroso, apesar dessa agressividade, que é esporádica, ele é uma criança muito amorosa (Entrevista 1).
O que ela fazia era o normal, pra idade, né? E cresceu saudável, inteligente. Ela sempre foi uma menina muito inteligente, muito... assim, ela tem uma... talvez por experiência dela já ou mesmo que ela é uma pessoa que tem uma inteligência muito aguçada, ela tem 10 anos, mas tem comportamento de uma menina de 15, de 16 anos. Assim, tem uma certa maturidade, compreende exatamente o que você quer [...] (Entrevista 2).
A evolução foi boa, devagarinho, mas foi boa [...] Seis anos e pouco ele aprendeu a ler, a escrever, todo mundo até se admirou [...] Está fazendo pelo segundo ano a terceira série, era para estar na quarta série. Mas a evolução dele a psicóloga disse que é até boa, pra ele que não sabia nem falar com 3 anos. Mas agora ele está indo bem mesmo [...] (Entrevista 3).
No início foi complicado, era muito calado, houve rebeldia, regressão... muito ciúme de uma sobrinha minha, da mesma idade, e de dois afilhados que tenho... Hoje melhorou uns 60% (Entrevista 4).
Diante desses relatos, pôde-se constatar o quanto é importante para a criança que os pais a amem sem medo e que possam lhe oferecer um ambiente seguro. Segundo Weber (1998, p. 112), os pais devem “proporcionar oportunidades para a criança de expressar as suas dores e tristezas, ou até raiva e sentimentos de perda”.
Cristina Maria de Souza Brito Dias
Professora e pesquisadora da Universidade Católica de Pernambuco. Coordenadora do laboratório Família e Interação Social. Rua Conselheiro Portela, 130 A, apto 201, 52020-030, Recife, PE.
cristina_britodias@yahoo.com.br
Ronara Veloso Bonifácio da Silva
Concluinte do curso de Psicologia e Bolsista PIBIC/UNICAP. Rua Nelson Castro e Silva, 117, Jardim São Paulo, 50910-440, Recife, PE, Brasil.
ronara_veloso@yahoo.com.br
Célia Maria Souto Maior de Souza Fonseca
Professora e pesquisadora da Universidade Católica de Pernambuco. Rua Edson Álvares, 211/102, Casa
Forte, 52061-450, Recife, PE, Brasil.
celiasoutomaior@yahoo.com.br
Postado Por Cintia Liana